O acréscimo de R$ 0,30 na tarifa de ônibus de Porto Alegre, referente a um percentual de 10,85%, foi sancionado pelo prefeito José Fortunati nesta quinta-feira. A partir de domingo, o valor, atualmente em R$ 2,95, já será de R$ 3,25. As lotações custarão R$ 4,85.
Segundo a planilha técnica apresentada pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) na reunião do Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu), ocorrida pela manhã, os itens que mais impactaram na passagem foram a despesa com recursos humanos e o custo da manutenção dos veículos. O relatório apontou uma passagem de R$ 3,2691. O reajuste foi aprovado por 14 votos a três. Durante o encontro do conselho, um grupo de cerca de 80 pessoas protestava em frente à sede da EPTC.
O gerente executivo e representante da Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP) no conselho, Luiz Mario Magalhães Sá, votou a favor do valor, mas preferia que o montante fosse maior. “O sistema de transporte coletivo de Porto Alegre passa por uma crise financeira sem precedentes, o que nos preocupa, pois estamos há dois anos só mantendo o que temos, sem fazer investimentos. A frota está envelhecendo gradualmente e, lá na frente, isso afetará a qualidade do serviço”, garantiu.
A entidade representa os interesses das empresas que operam os ônibus na Capital. Antes de a EPTC anunciar sua proposta, a ATP havia sugerido que a passagem custasse R$ 3,49. Como o valor ficou muito abaixo do que a associação esperava, Sá assegura que não há possibilidade de renovar a frota.
Ele ressaltou, ainda, a boa qualidade do transporte público porto-alegrense, se comparado com outras capitais. “O tempo médio de espera aqui é de 19 minutos, perdendo só para Curitiba, onde é de 18. Há locais em que esse período supera os 30 minutos. O tempo da viagem é o menor de todos, sendo de 56 minutos no total, enquanto no Rio de Janeiro, por exemplo, é de 96 minutos”, disse.
A reunião desta quinta foi a última com Luis Afonso Martins como representante da Central Única de Trabalhadores (CUT). O rodoviário anunciou, depois da votação, que abandonará o Comtu e também a CUT. “Quem analisar a planilha será favorável, pois ela está correta tecnicamente, mas sua metodologia está completamente equivocada. Na planilha, consta que estamos dando nosso dinheiro para os empresários. Este conselho é uma falácia, um circo armado em que a sociedade sai perdendo e só quem ganha são os empresários”, critica. Martins sugeriu que a prefeitura subsidie o aumento e que o transporte seja totalmente operado pela empresa pública Carris.
Getúlio Vargas Júnior, representante da União das Associações de Moradores de Porto Alegre (Uampa), destacou que a inflação dos últimos dez anos foi 20% menor do que o reajuste médio da tarifa. “Além disso, falta elaboração do Plano de Mobilidade de Porto Alegre, previsto por lei na Política Nacional de Mobilidade Urbana para ser implantado até este ano. Outra questão são as duas licitações esvaziadas, que previam um valor inferior na passagem”, relatou.
Todos esses componentes, somados à falta de debate com a comunidade, fazem com que a entidade julgue ser responsabilidade da prefeitura subsidiar o aumento e as isenções oferecidas a idosos, deficientes e a certas áreas profissionais, bem como a meia passagem para estudantes. As isenções representam 35% do valor da tarifa, conforme a ATP. “Retirando 35% do preço da passagem, ela não estaria em R$ 2,95, mas sim em R$ 1,91, e o reajuste pedido não seria de R$ 3,27, mas sim de R$ 2,12”, ponderou Vargas.
Para presidente do Comtu, querer serviço qualificado com passe livre é ‘demagogia barata’
O presidente do Comtu, Jaires da Silva Maciel, defendeu a reavaliação anual de custos para manter o sistema funcionando. Sobre a possibilidade de a prefeitura subsidiar isenções, responsabilizou a Câmara Municipal. “Há uns três anos, o conselho encaminhou uma resolução à Casa, que foi acatada, dizendo que todas as isenções que fossem concedidas deveriam indicar, juntamente, a fonte daquele financiamento. Agora estamos vivendo esse episódio da Brigada Militar, que poderá ter seu efetivo com direito a passe livre com ou sem farda, e eles não sinalizaram a fonte da isenção, rompendo o que prometeram”, reclamou.
Os índices de inflação apresentados pelo governo federal foram questionados por Maciel. “O que não está acima da inflação? Não é só a passagem de ônibus. A declaração oficial de inflação é que está abaixo dos preços ideais. Criou-se uma ilusão de que os índices inflacionários promulgados pelo governo federal são uma verdade absoluta, mas os preços das coisas têm a sua própria realidade”, argumentou. “Por que a Mercedes Benz ou a Volvo venderiam ônibus no Brasil mais baratos do que lá fora? São todas empresas multinacionais, que têm cotação internacional, e não são tão afetadas pela inflação brasileira.”
Para Maciel, é “demagogia barata” imaginar que é possível haver transporte público e de qualidade gratuitamente. “Nem a saúde pública consegue ser gratuita e eficiente. Então, acho que está na hora de parar com essa demagogia barata e entender que, para se ter um serviço de qualidade, é preciso pagar por ele”, concluiu.
O presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Álvaro Fernandes Lottermann, garantiu que a entidade continuará acompanhando a questão. “A pauta é muito importante para os estudantes e a sociedade, e não vamos arredar da posição de aumento zero”, avisou. “O transporte coletivo tem que ser discutido de forma mais ampla e democrática com a sociedade, pois tem sido muito de portas fechadas, no conselho, que é um espaço já dominado pelos empresários. Acreditamos que a sociedade precisa ser trazida para esse debate.”
Por Isabella Sander
Informações: Jornal do Comércio