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Uso de ônibus como meio de transporte nas cidades caiu em todo o País

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Nos últimos sete anos, a participação dos ônibus como meio de transporte utilizado pela população de todo o País teve uma queda de 14,3 pontos percentuais, passando de 45,2% em 2017, para 30,9% em 2024.

Os dados são de um estudo inédito feito pela Confederação Nacional de Transportes (CNT) sobre mobilidade e transporte público, apresentado nesta segunda-feira (25) em Belo Horizonte para especialistas e empresários do setor.

A tendência é considerada preocupante já que nem as cidades e nem o setor de transporte urbano estão aptos a receber um grande volume de transporte individualizado. Isso porque os municípios não possuem infraestrutura para tantos veículos. E no caso das empresas do setor, ter apenas o passageiro pagante para custear o sistema não é suficiente.

“Ou a gente começa a priorizar o transporte público, a voltar o foco para melhorar o sistema e retomar a chamada de usuários, ou as cidades, num período não tão longo, vão parar”, alerta o diretor executivo da CNT, Bruno Batista.

Atualmente, o tempo perdido no trânsito das principais capitais do País é significativo. Um percurso de 10 quilômetros (km) durante um congestionamento chega a ser em média 90% maior que um período de viagem considerado “normal”. Em Belo Horizonte, o índice chega a ser ainda maior, alcançando 103%.

Uma viagem normal de 10 km que dura cerca de 28 minutos, passa para 57 minutos durante um congestionamento.

Fetram defende parceria com a iniciativa privada

O presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de Minas Gerais (Fetram), Rubens Lessa, acredita que é necessária uma parceria entre poder público e iniciativa privada para solucionar o problema da mobilidade das cidades. 

“Aumentou muito o número de gratuidades. A expectativa de vida quando a gratuidade começou era 67 anos, hoje, é 80. É preciso uma fonte de custeio que não seja só o usuário pagante”, defende.

Para Lessa, é importante tanto aportes públicos de subsídios e custeio do sistema, quanto investimentos em infraestrutura de transporte como faixas e corredores exclusivos.

Em contrapartida, ele defende que as empresas forneçam um serviço de qualidade com transparência total nas suas prestações de contas. “Se nada for feito, as pessoas não conseguirão circular pelas grandes cidades. Será um colapso total”, alerta.

Individualização do transporte
O presidente da CNT, Vander Costa, também ressalta a preocupação pela tendência de individualização do transporte. Ele acredita que para reverter a situação é preciso melhorias nas condições ofertadas e incentivo ao uso do transporte coletivo.

Costa defende que empresas e poder público trabalhem para oferecer segurança, previsibilidade e conforto.

“Tendo estes três itens, naturalmente, as pessoas deixam o automóvel em casa e vão para o público, como acontece nas grandes cidades do exterior”, comentou.

O que leva os usuários a abandonarem os ônibus?
De acordo com a pesquisa, os motivos para que boa parte da população substitua o transporte coletivo por opções alternativas ocorrem, principalmente, por causa do pouco conforto dos ônibus e da falta de flexibilidade dos serviços, que estão relacionadas a rotas e horários, e também ao elevado tempo de viagem.

O preços das passagens e a insegurança também são itens citados mas, dessa vez, foram menos mencionados pela população.

O diretor executivo da CNT, Bruno Batista, enxerga os motivos apontados pela população como pontos de atenção tanto para a iniciativa privada quanto para a iniciativa pública.

“O preço que, no passado, era apontado por 29% dos entrevistados como motivo para abandonar o transporte público, já não é mais um dos motivos principais para o abandono. A comodidade e a conveniência oferecidas pelo transporte alternativo fizeram dos aplicativos grandes concorrentes, sobretudo, nas pequenas viagens”, alerta Batista.

Veja mais dados da pesquisa:

a utilização do carro próprio subiu de 22,9% para 29,6%;
o uso da moto própria, mais do que duplicou, passando de 5,1% para 10,9%;
e o uso dos serviços de transportes por aplicativos, que em 2017, era praticamente inexistente, responsável por 1% da fatia, em 2024, já respondem por 11,1%

Passageiros voltariam para o ônibus se problemas fossem resolvidos

O diretor executivo da CNT ressalta, portanto, que 63,5% das pessoas que deixaram de utilizar o ônibus como principal meio de transporte, alegaram que poderiam voltar caso os motivos apontados para o abandono fossem resolvidos.

“As pessoas querem uma boa experiência, querem ter informação, querem saber daqui a quanto tempo o ônibus vai chegar, e quanto tempo vão esperar. Elas querem esperar o mínimo possível. Quando o tempo de espera reduz, a avaliação do serviço melhora, pois a viagem fica mais rápida”, comenta. 

Bruno Batista defende o ônibus como principal solução. Ao considerar que 31,7% da população usam o transporte coletivo e, dentro dessa faixa, mais de 81% usa ônibus, ele é taxativo: “o ônibus não é só fundamental na vida urbana, ele é insubstituível. Pela capilaridade, pela possibilidade de implantação de sistemas e, sobretudo, pela flexibilidade que ele permite ao chegar em áreas que nem metrô ou BRT chegarão”, comenta.

Ao defender o ônibus, o diretor também considera a questão da segurança. “O ônibus é mais seguro e mais barato que a motocicleta, e a população precisa saber disso”, conclui.

Informações: Diário do Comercio
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Metrô de SP completa 50 anos com malha ainda insuficiente

terça-feira, 17 de setembro de 2024

Sistema paulistano foi o pioneiro do país. Especialistas avaliam que avanço do sistema metroferroviário nas últimas décadas continua aquém da necessidade das grandes cidades brasileiras.Primeiro do país, o metrô de São Paulo entrou oficialmente em operação em 14 de setembro de 1974. Cinquenta anos depois, a malha de transporte urbano sobre trilhos no Brasil ainda está aquém do ideal, conforme apontam especialistas.

Em 1974, noticiou o jornal O Estado de S. Paulo: a inauguração do novo sistema de transporte da capital paulista foi uma festa com "balões de gás, bandas, desfiles de escolares, sambistas, sanfoneiros e folhetos de propaganda política" em que "o povo só pode ver de longe os passageiros do 'trem da alegria', o metrô", que fez o percurso inaugural do pequeno trecho então inaugurado, os 7 quilômetros entre Jabaquara e Vila Mariana.

Marketing político à parte, a inauguração finalmente fez com que o Brasil entrasse nos trilhos do sistema de transporte urbano rápido que já era consolidado em grandes cidades pelo mundo, como em Londres — em operação desde 1863 —, Paris — desde 1900 —, Berlim — inaugurado em 1902 — e Nova York — onde começou a funcionar em 1904. A vizinha argentina teve o metrô de Buenos Aires inaugurado em 1913.

São Paulo precisaria de malha seis vezes maior

De lá para cá, houve avanços, mas ainda tímidos. A mentalidade brasileira ainda privilegia o transporte rodoviário em relação ao sobre trilhos — e a sociedade valoriza o status do transporte individual em detrimento do coletivo.

Em São Paulo, a rede metroviária atual é formada por 6 linhas — oficialmente, já que uma é, na verdade, um sistema de monotrilho —, totalizando 104 quilômetros de extensão e 91 estações. Segundo dados do governo paulista, são 5 milhões de passageiros transportados todos os dias. Para efeitos de comparação, o metrô de Nova York tem 24 linhas com 468 estações espalhadas por 369 quilômetros de extensão e o de Londres, 16 linhas, 272 estações e cerca de 400 quilômetros.

"Metrô é o modal que viabiliza de forma humana e racional a mobilidade em cidades, sendo imprescindível em metrópoles com mais de 2 milhões de habitantes", argumenta o engenheiro de transporte Sergio Ejzenberg, consultor e especialista em mobilidade. "A conta é simples. Tomando como paradigma metrópoles adensadas, é preciso 50 quilômetros de metrô para cada milhão de habitantes."

Ou seja: São Paulo precisaria de seis vezes mais. "Isso explica a lotação do nosso metrô e explica por que cada linha colocada em operação lota nas primeiras semanas de funcionamento. E mostra a estupidez do investimento em sistemas de média capacidade, como monotrilhos e VLTs", acrescenta Ejzenberg.

De acordo com a Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) há hoje metrô operando em Fortaleza, Recife, Salvador, Brasília, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Especialistas discordam.

"Metrô mesmo no Brasil tem somente em São Paulo, no Rio e em Brasília", aponta o engenheiro de transportes Creso de Franco Peixoto, professor na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "Outras cidades costumam chamar de metrô o que na verdade são linhas ferroviárias de carga que foram adaptadas para que fossem usadas como metrô."

Tecnicamente, como ele explica, o metrô consiste em linhas construídas em regiões adensadas, com paradas planejadas em curtas distâncias, a partir de pesquisas detalhadas sobre comportamentos de origem e destino da população.
 
"A denominação metrô é adotada por diversos sistemas como imagem poderosa de marketing institucional, mesmo quando aplicados em locais que não se enquadrariam nessa categoria sob uma análise mais rigorosa", comenta o engenheiro especialista em mobilidade Marcos Bicalho dos Santos, consultor em planejamento de transportes.

Ele considera metrôs, além dos sistemas de São Paulo, Rio e Brasília, as linhas de Salvador e de Fortaleza. E classifica como uma segunda divisão os modelos "de alta capacidade, implantados aproveitando infraestruturas ferroviárias desativadas", ou seja, os chamados metrôs de Belo Horizonte, Porto Alegre e do Recife.

"Neste grupo poderiam também ser incluídos os trens urbanos, que atendem a elevadas demandas, mas que apresentam características operacionais distintas dos metrôs [principalmente quanto à velocidade, frequência e distância entre paradas]", acrescenta Santos, citando os trens metropolitanos de São Paulo e do Rio de Janeiro.

O restante da malha de trilhos urbanos do Brasil (veja infográfico), o especialista classifica como "uma quarta categoria […] que, em função de sua inserção urbana ou por limitações de seus projetos operacionais, operam como sistemas de média capacidade, às vezes nem isso, atendendo a demandas pouco expressivas".

Atraso histórico e mentalidade rodoviarista

No total, a malha de trilhos urbanos é de 1.135 quilômetros e está presente em 12 das 27 unidades da federação. "Somos um país de dimensões continentais e essa infraestrutura de trilhos para passageiros é insuficiente para o atendimento à população", admite o engenheiro eletricista Joubert Flores, presidente do conselho da ANPTrilhos. "Mas essa rede de atendimento tem previsão de crescimento, já que contamos com 120 quilômetros de projetos contratados ou em execução, com indicação de conclusão nos próximos cinco anos. Para 2024, a previsão é inaugurarmos 20 quilômetros."

Se o transporte sobre trilhos é tão útil, por que o Brasil está tão atrasado? Primeiramente, pela mentalidade histórica. "Houve uma efetiva priorização do transporte rodoviário de passageiros, e mesmo de cargas, pelos governos brasileiros. Este talvez tenha sido o principal motivo de perdermos cerca de 20 ou 30 anos para o início do transporte metroferroviário em São Paulo e no Brasil. Talvez tenha havido uma falta de vontade política e de visão dos governantes à época", comenta o engenheiro metalurgista Vicente Abate, presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer).

Para o urbanista Nazareno Affonso, diretor do Instituto Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos (MDT), o Brasil sempre foi "carrocrata". "O Estado não prioriza o transporte público e prioriza investimentos ligados à indústria automobilística", diz, enfatizando que as maiores cidades do país "caminham para o colapso se não houver investimentos permanentes e crescentes em sistemas metroferroviário e de ônibus".

"O estratosférico custo dos congestionamentos e dos sinistros de trânsito no Brasil inibe o crescimento e rouba parcela significativa do PIB", argumenta Ejzenberg, que calcula prejuízos diretos e indiretos de até 50 bilhões de reais por ano por conta disso, apenas na metrópole de São Paulo. "Esse custo anual, se investido em metrô, estancaria as perdas e daria maior competitividade ao Brasil. Continuamos nadando no sangue das vítimas evitáveis, ano após ano."

O custo é um grande gargalo, é verdade. Segundo levantamento do professor Peixoto, dificilmente uma obra de metrô no Brasil custa menos de 80 milhões de dólares por quilômetro. "Metrô é muito caro. Muito caro. Mas é preciso pensar que ele é capaz de transportar muita gente", comenta.

"O Brasil não investiu em transporte sobre trilhos por incompetência, insegurança jurídica e imediatismo político", critica Ejzenberg. Apesar de ser uma obra cara, ele argumenta que o modal sobre trilhos acaba tendo metade do custo do sistema de ônibus se considerado o custo do passageiro transportado por quilômetro — esta seria a incompetência, segundo o especialista. No caso da questão jurídica, ele diz que as mudanças no entendimento de como viabilizar parcerias privadas acabam afastando investidores. Por fim, politicamente há o peso eleitoreiro de que uma obra de metrô costuma levar mais do que um mandato de quatro anos entre o anúncio e a inauguração.

Solução é complexa
 
Mais metrô melhoraria em muito a qualidade de vida do brasileiro que habita as grandes cidades. Mas não é a solução mágica. "Para enfrentar a crise dos deslocamentos é preciso investimento em metrô, em ferrovias, em VLT. Mas não podemos descuidar da democratização das vias públicas, dando aos ônibus faixas exclusivas. E também a mobilidade ativa que tem crescido, com ciclovias e ciclofaixas para que avancemos nessa questão", sugere Affonso.

"Metrôs não são uma panaceia. Não são a única solução para os problemas na mobilidade urbana", acrescenta Santos. "Em muitas situações, não são a solução mais indicada, já que as soluções dependem de cada local e não podem ser unimodais."

Ele enfatiza que por mais eficiente que seja uma linha de metrô, "ela não será eficaz se as pessoas não conseguirem chegar até ela, caminhando, pedalando, usando transporte público alimentador e mesmo modos de transporte individual". O especialista salienta que, considerando isso, respectivamente é preciso também investir em calçadas adequadas, rede cicloviária e bicicletários, integração física, operacional e tarifária dos meios de transporte público e, por fim, estacionamentos e baias para desembarque e embarque para aqueles que vão chegar de carro.

"Resumindo, precisamos de planejamento urbano e de mobilidade, integrados, e não apenas de um plano de obras e compra de equipamentos", adverte ele.

Informações: Terra

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Brasil se aproxima de 600 ônibus elétricos no transporte público, mas Chile lidera com 2,4 mil

quarta-feira, 7 de agosto de 2024

Visto como uma forma de reduzir a emissão de dióxido de carbono — um dos principais gases do efeito estufa — pelo transporte público, o ônibus elétrico integra a frota de cidades de 11 países na América Latina, segundo o E-Bus Radar, plataforma desenvolvida pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Universidade Técnica da Dinamarca. O Brasil é o quarto país com mais veículos do tipo na região, mas tem apenas 578.

Chile (2.456), Colômbia (1.590) e México (752) ocupam as primeiras posições. De acordo com levantamento da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), a frota nacional conta com 107 mil ônibus para o transporte público, de modo que os elétricos representam apenas 0,5% do total.

Os 578, que incluem 276 veículos movidos a bateria e 302 trólebus (que obtém energia de linhas aéreas), estão espalhados por cinco estados (Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia) e o Distrito Federal. A capital paulista é a cidade com mais ônibus elétricos no transporte público, com 381.

O E-Bus Radar estima que com a quantidade atual, será evitada a emissão de 61,05 quilotons de dióxido de carbono por ano.

Cada país signatário do Acordo de Paris, como o Brasil, estabeleceu metas de redução de emissão de gases do efeito estufa, chamadas de Contribuição Nacionalmente Determinada. A Contribuição brasileira estabelece que o país deve reduzir as suas emissões em 48% até 2025 e 53% até 2030, em relação às emissões de 2005.

O Brasil também se comprometeu em alcançar emissões líquidas neutras até 2050, ou seja, tudo que o país emitir deverá ser compensado com fontes de captura de carbono, como plantio de florestas ou recuperação de biomas. Os gases do efeito estufa contribuem para o aquecimento global e as mudanças climáticas.

Nesse cenário, o ônibus elétrico aparece como uma ferramenta importante. Porém, para sua implementação no transporte público no território brasileiro, há uma série de desafios a serem superados, e isso tem impedido sua disseminação nas frotas em ritmo acelerado no país.

Entre os desafios, estão o custo mais elevado que o dos ônibus convencionais, a necessidade de preparação da rede elétrica das cidades para suportar maior consumo de energia e a importância de capacitar pessoas para fazer a manutenção dos novos veículos.

O economista Wesley Ferro, secretário-executivo do Instituto Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte (Instituto MDT), explica que o ônibus a bateria "custa na faixa de R$ 3 milhões, R$ 3,5 milhões". Já um ônibus a diesel convencional, mesmo com motor de tecnologia mais moderna, que possui um nível de emissões de gases menor, está na faixa de R$ 800 mil.

"A diferença [de preço] entre um ônibus e outro é grande. Então o volume de recursos que precisa para investimento em frota é muito mais alto", pontua o especialista.

Ele salienta que você comprar um ônibus de R$ 3,5 milhões e colocá-lo para operar em uma cidade que não tem infraestrutura exclusiva para ônibus nem recursos assegurados para o financiamento do transporte público, como é caso da maioria ou todas as cidades brasileiras, "é um investimento de alto risco". Dessa forma, muitas vezes, a preferência dos governos locais acaba sendo por investir num ônibus que não terá emissão zero de gases, mas possui motor Euro 6, por exemplo, que emite muito menos que outros mais antigos.

Em relação à preparação da rede elétrica das cidades, ele ressalta que São Paulo, por exemplo, estabeleceu uma meta para ter 2.600 ônibus elétricos na frota municipal até o final de 2024, mas não conseguiu avançar rapidamente para alcançá-la. O motivo é porque esbarrou "num grande problema": a necessidade de investimentos em infraestrutura de instalação para garantir o fornecimento de energia para os veículos que estão sendo implementados.

"Os estudos técnicos que foram feitos lá em São Paulo mostraram que se você tivesse 50 ônibus carregando ao mesmo tempo durante um período em determinada região, você derrubava a energia do restante da população toda".

O doutor em transportes Pastor Willy Gonzales Taco, líder do Grupo de Pesquisa Comportamento em Transportes e Novas Tecnologias (GCTNT), da Universidade de Brasília, reforça que os ônibus elétricos vão consumir a mesma energia que já é consumida na cidade para vários tipos de uso.

"Como as cidades [brasileiras] estão preparadas para isso? Ninguém se preparou para isso. E aí entra um concorrente, que vem a ser os veículos particulares de passeio, que já consomem energia, iria ter um bom número de veículos elétricos percorrendo as vias".

Para o especialista, é preciso "compreender as potencialidades de produção energética de cada cidade. Cada cidade tem sua característica. Alguns municípios Brasil já estão implementando há um bom tempo outros tipos de energia para sustentar os veículos. Biodiesel e assim vai".

Ele salienta que o planejamento do município para comprar ônibus elétricos precisa considerar ainda o fato de que o modelo pode já se tornar ultrapassado no ano seguinte, visto que a tecnologia avança rapidamente.

Autonomia
De acordo com Wesley Ferro, a autonomia dos ônibus elétricos com bateria é menor que dos ônibus convencionais.

"Esses primeiros ônibus elétricos que foram incorporados nas redes, nas cidades, eles têm a autonomia muito baixa, na faixa de 200 km, no máximo 250 km. Portanto, para operarem, eles são colocados em linhas muito específicas, que são linhas com extensões menores", afirma. As linhas costumam também não ter muitas subidas.

No caso do trólebus, há a questão de ser pouco flexível, por depender da rede elétrica. A circulação fica restrita a vias que possuam rede aérea de energia.

Falando sobre as experiências internacionais, o secretário-executivo do Instituto MDT diz que o Chile e a Colômbia já estão no processo de eletrificação do transporte público há mais tempo que o Brasil. Em Bogotá, capital colombiana, a multinacional italiana Enel, que atua no ramo de geração e distribuição de eletricidade e gás, ajuda na compra de ônibus elétrico e distribui para operadores.

Investimentos em transporte público
O transporte público por si só é uma forma de reduzir a emissão de gases do efeito estufa, porque diminui o número de veículos particulares em circulação.

Segundo o relatório de síntese sobre o diálogo técnico do primeiro balanço global do Acordo de Paris, publicado pelo secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas em setembro de 2023, o transporte contribui com aproximadamente 15% das emissões globais de gases do efeito estufa, e a eliminação gradual de motores de combustão interna e o uso de veículos elétricos "oferecem o maior potencial de mitigação no setor".

"Além disso, intervenções do lado da demanda, como a mudança de modos de transporte (por exemplo, para caminhar e usar o transporte público), serão essenciais no contexto de repensar a mobilidade".

A organização ambientalista World Resources Institute, de Washington, nos Estados Unidos, ressalta que ônibus e trens podem diminuir as emissões de gases de efeito estufa em até dois terços por passageiro por quilômetro em comparação com os veículos particulares.

Entretanto, o Orçamento da União de 2024 prevê um percentual pequeno de despesas com apoio a sistemas de transporte público coletivo urbano, funcionamento dos sistemas de transporte ferroviário urbano de passageiros e capacitação de recursos humanos para transportes coletivos urbanos, as ações orçamentárias mais específicas sobre transporte público.

As dotações atuais são de R$ 140,4 milhões, R$ 591 milhões e R$ 1,2 milhão, respectivamente, representando somadas 0,01% dos R$ 5,39 trilhões previstos pelo Orçamento com despesas. Dos totais, R$ 88,5 milhões, R$ 111,5 milhões e R$ 283,5 mil foram realizados até o momento.

Em relação às emendas parlamentares, dos 213 congressistas da Frente Parlamentar Mista do Transporte Público, apenas o deputado Marcello Crivella (Republicanos-RJ) direcionou quantia para alguma dessas ações orçamentárias, sendo R$ 400 mil para apoio a sistemas de transporte público coletivo urbano. A dotação atualizada total das emendas dos parlamentares da frente é de R$ 8,6 bilhões.

Ainda em relação às emendas, no total, são direcionados R$ 17,1 milhões para funcionamento dos sistemas de transporte ferroviário urbano de passageiros e apoio a sistemas de transporte público coletivo urbano, com as bancadas de Goiás e Rio Grande do Norte tendo direcionados montantes também.

Para Wesley Ferro, o tema do transporte público ainda está distante da agenda de prioridades do setor público no Brasil.

Também, de acordo com ele, apesar de alguns processo estarem em andamento, como a discussão da renovação de frota elétrica, a chegada de linhas de financiamento de parceiros e bancos, como o BNDES, e a discussão de um marco legal para o transporte público (proposta tramitando no Senado), a política de mobilidade urbana "não é prioridade" do governo federal nem dos estados e municípios.

"Faltam recursos, falta qualificação de corpo técnico, faltam projetos qualificados para serem implementados", pontua.

Wesley ressalta que, historicamente, o sistema de transporte público no país "foi sempre financiado basicamente pela tarifa paga pelos usuários".

"A receita gerada nas catracas era a única fonte de financiamento do sistema de transporte público. Então servia para custear o sistema, manter o sistema em operação, e minimamente para fazer algum nível de investimento".

Com a queda da demanda durante a pandemia, mas necessidade de manter a oferta do serviço, visto que trabalhos essenciais não pararam, a fragilidade do modelo ficou evidente. A Política Nacional de Mobilidade Urbana, de 2012, acrescenta Wesley, "já apontava alguns caminhos que deveriam ser adotados para você mudar esse quadro, ter financiamento para o transporte público". Porém, para os instrumentos de gestão de política de mobilidade urbana apresentados serem implementados nas cidades, eles pressupõem "que você compre algumas brigas dentro da cidade".

É possível, por exemplo, a taxação do uso do automóvel dentro dos municípios. "Mas esse é um caminho que os gestores evitam. Ninguém quer que se indispor com determinados setores da sociedade".

O secretário-executivo do Instituto MDT salienta ainda que a transição energética não resolve "o problema do transporte público no Brasil", ou seja, você reduz emissões, pode estar cumprindo metas pactuadas nos acordos internacionais, mas se o transporte público continuar sem infraestrutura exclusiva para circulação nas cidades, como faixas e corredores exclusivos, corre-se o risco de ter uma frota eletrificada presa em congestionamento.

"Portanto, a infraestrutura tem o poder de contribuir também para a redução de emissões, num nível muito próximo do que você imagina com a substituição da frota por outra matriz".

O Instituto MDT apoia a implementação, no país, de um Sistema Único de Mobilidade. "A gente defende que esse é um caminho para que o transporte público possa ser de fato o grande estruturador das cidades e a grande prioridade das gestões públicas".

Na opinião de Taco, a atenção dos congressistas e do governo federal ao transporte público "está mais voltada à questão dos subsídios".

"Quando você vê as diversas demandas que se tem, é justamente mais voltada para os subsídios, ou seja, para atender os custos derivados da operação do transporte. Em termos especificamente de infraestrutura, tem havido uma paralisação ao longo dos anos".

Segundo o líder do Grupo de Pesquisa Comportamento em Transportes e Novas Tecnologias, ao se observar os investimentos que os municípios fazem, salvo exceções e algumas grandes regiões metropolitanas, percebe-se que eles estão voltados mais para infraestrutura para o carro do que ao transporte público.

Atuação do BNDES
Em maio, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou que financiará a renovação da frota de ônibus em municípios brasileiros. "Ao todo, serão investidos R$ 4,5 bilhões para aquisição de 1.034 ônibus elétricos e 1.149 ônibus Euro 6, que reúnem o que há de mais moderno no mundo em termos de eficiência energética e baixo consumo de combustível", acrescentou o comunicado.

O banco explicou que a renovação de frota com veículos sustentáveis é uma das modalidades do Novo PAC Seleções. Ela prevê a destinação de R$ 10,5 bilhões para a aquisição de 2.529 ônibus elétricos, 2.782 ônibus Euro 6 e 39 trens para atender 98 municípios. "Além do financiamento do BNDES, no valor de R$ 4,5 bilhões, a Caixa Econômica Federal financiará 39 trens, 1.495 ônibus elétricos e 1.633 ônibus Euro 6, com investimento de R$ 6 bilhões para essa modalidade".

A diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do BNDES, Luciana Costa, reforça algumas das dificuldades para implementação do ônibus elétrico no transporte público, como o custo bem mais elevado para compra do veículo. Luciana ressaltou vantagens dele em relação ao convencional: possui um custo de manutenção cerca de 80% menor; custo de operação "muito menor", porque energia elétrica é muito mais barata do que diesel; ajuda o país no cumprimento do Acordo de Paris, por não emitir gases do efeito estufa; é silencioso; e não emite poluentes.

Conforme a diretora, diante desses benefícios, o investimento em eletromobilidade, embora ele seja maior inicialmente, "é um investimento que se repaga". Ela pondera que, em alguns lugares no país, ainda não caberá uma frota eletrificada, porque as prefeituras brasileiras têm capacidades financeiras muito diferentes entre si.

Luciana salienta que o Brasil possui "um grande déficit" de infraestrutura de mobilidade urbana, estimado pelo BNDES em R$ 360 bilhões.

"Em 2022, foi investido 0,06% do PIB em mobilidade urbana nos modais de média e alta capacidade. Dentro desse número de R$ 360 bilhões, a gente não considera ônibus. A gente só considera metrô, VLT", explicou. A meta do banco é elevar o percentual de investimento para 0,25% do PIB.

Segundo Luciana, "o histórico de investimento no Brasil, seja em média e alta capacidade, seja em ônibus, é de instabilidade, imprevisibilidade e insuficiência. Por isso que essa pauta de mobilidade urbana, desde que essa gestão assumiu o BNDES, se tornou uma das grandes prioridades, nós sabemos que o desafio é enorme".

O banco está realizando um estudo nacional de mobilidade urbana para identificar qual seria a estrutura de média e alta capacidade que deveria ser implementada. A ideia é criar um banco de projetos para média e alta capacidade, que servirá deum insumo para a estratégia nacional de mobilidade urbana. O estudo começou no início deste ano e deve ser concluído no início do próximo ano. O custo para sua realização será de R$ 27 milhões.

Exemplo de Curitiba
Curitiba, que tem sete ônibus elétricos em sua frota do transporte público, sendo seis que começaram a circular em julho e um que deve começar a circular em agosto, tem como meta fazer com que 33% de sua frota seja elétrica até 2033 e 100% até 2050. Hoje, no total, são 1,1 mil ônibus na capital paranaense.

Segundo a Urbs, que gerencia o transporte coletivo na cidade, 54 ônibus elétricos vão ser adquiridos em 2025, com R$ 380 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). "Mais 70 estão programados com lei aprovada na Câmara Municipal de Curitiba, que prevê recursos de R$ 317 milhões nos veículos".

Questionada se a prefeitura entende que o investimento em transporte público e na descarbonização da frota são medidas importantes para o enfrentamento das mudanças climáticas, disse que "sem dúvida". "Os novos ônibus representam um salto tecnológico e um passo decisivo rumo a uma Curitiba mais sustentável. Sem emissões, sem ruído, com maior conforto térmico, eles trazem uma série de benefícios para a população".

O projeto de descarbonização da frota do município começou em 2018, e, em 2023, teve início os primeiros testes com veículos elétricos. Foram testados ônibus das marcas BYD, Eletra, Marcopolo, Volvo e Ankai até o momento.

"Em paralelo, Curitiba comprou os primeiros veículos elétricos. Cada ônibus elétrico evita, em média, a emissão de 118,7 toneladas de CO2 ao ano na atmosfera, o equivalente ao plantio de 847 árvores por veículo".

Os ônibus elétricos são os primeiros da frota da cidade com ar-condicionado. Possuem piso baixo para melhor embarque e desembarque de pessoas com mobilidade reduzida e contam também com entradas USB para recarga de celulares e sistema de anúncio de fechamento das portas. Em relação aos bancos, 20% são reservados para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Os veículos têm dois espaços para cadeirantes.

"O novo contrato de concessão do transporte coletivo, previsto para 2025, que está sendo formatado em parceria com o BNDES, já contemplará, na sua origem, a operação também de frota elétrica e redução de emissões de gases de efeito estufa", diz a Urbs.

O novo modelo de concessão será o primeiro do Brasil a contemplar, já na sua origem, a prioridade de redução de emissão de gases do efeito estufa com mudança na matriz energética; de acordo com a Urbs, isso "traz também segurança jurídica". Os dois grandes projetos do transporte coletivo em andamento em Curitiba — novo Inter 2 e BRT Leste-Oeste — terão frota elétrica.

A Urbs pontua que as precisam ser "mais resilientes às mudanças climáticas" e buscar soluções para "mitigar esse problema e evitar seu agravamento". "A eletrificação da frota das cidades é um passo importante para tornar as cidades mais sustentáveis, com zero emissões de gases do efeito estufa, de material particulado, e de poluição sonora".

A empresa pondera que, como toda nova tecnologia, apresenta desafios, por exemplo a forma de estruturação da aquisição dos veículos, e a oferta de ônibus e de fontes de financiamento.

Informações: SBT News

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O que falta para a mobilidade sobre ônibus ser atrativa?

segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Sempre que são discutidas as soluções para os problemas do transporte por ônibus no Brasil vemos que o foco se limita aos seus elementos básicos, o feijão com arroz. Aponta-se a falta de velocidade, capacidade, frequência, segurança, confiabilidade, sem contar com o conforto mesmo da viagem. É claro que esses são requisitos básicos para a aceitação desse mais importante meio, mas por que será que até hoje não se conseguiu o apoio para mudar isso?

Ninguém duvida que os ônibus são úteis, mas parece que não são desejados, e em uma sociedade de consumo e com viés importante de desejo por status e distinção, a paixão é o poder que abre todas as portas! Mesmo consertando todos esses defeitos objetivos, já descritos, seremos automaticamente e imediatamente amados?

Ao pesquisarmos as duas palavras do título observamos alguns pontos característicos e curiosos sobre os seus significados. Enquanto a utilidade é medida por objetivos claros a serem alcançados com o uso do objeto, o desejo parece ser satisfeito por ele mesmo, e muitas vezes de forma misteriosa e pouco clara. A diferença de força e complexidade do desejo é evidente até mesmo na quantidade de definições e explicações que requer. 

Nosso primo-irmão tecnológico, o automóvel, cedo compreendeu essas diferenças e partiu para enfrentar enormes dificuldades e conquistar o desejo. Conseguiu até “corrigir” a seu favor realidades que davam vantagens a outros meios.

Se as cidades densas eram suas inimigas, partiu para viabilizar os subúrbios distantes, ao mesmo tempo atendendo ao desejo de moradias maiores e terrenos mais baratos. Conseguiu que as estradas necessárias para isso fossem construídas e pagas pela conta de todos, mesmo os que não as usassem. Os desejos “naturais”, como comprar objetos, namorar, foram adaptados para que fossem mais convenientes com o automóvel e as cidades também se adaptaram para serem acessíveis a eles e seus “donos”. O carro é uma propriedade que tem utilidade mesmo quando não é usado, enquanto o ônibus é um serviço prestado que, em vez de distinguir seus passageiros, os nivela, o oposto dos mandamentos da modernidade em que vive o carro.

Síntese: o serviço de ônibus é visto como um mal necessário, não é desejado porque é um mau parceiro, se comporta mal e não produz uma experiência feliz, não dá presentes na hora certa e não se antecipa aos sentimentos de seu público. Faz isso por depender de uma “família disfuncional” em que cada um detém parte do que ele precisa para se tornar o parceiro ideal, mas preferem não cuidar do sistema todo e não acreditam, de fato, que a história triste de hoje possa ser mudada. Esse é o pior preconceito e discriminação que impede o desejo.

Mas o que pode ser feito para reverter essa situação?
Diante do que já foi dito, a solução está em, como em qualquer relação deteriorada, surpreender o parceiro com indicadores de que o ônibus pertence aos serviços desfrutáveis por pessoas bem-apreciadas. Para isso, a primeira conquista precisa ser a independência financeira para poder gastar nessas transformações e ambientações.

Mas a qualidade do transporte por ônibus não é percebida apenas na viagem, como o caso do automóvel.

Há uma dependência íntima entre o que pode ser feito pelo operador e o que a cidade precisa prover. No caso do metrô, a experiência ocorre no interior de um ambiente completo controlado. A qualidade das estações, dos trens, as mensagens e a presença de agentes operacionais transmitem uma sensação de modernidade, segurança e atendimento que influenciam a imagem de quem o utiliza.

O ônibus precisará operar em uma cidade assim para ter os mesmos benefícios. O trânsito, a faixa de domínio, as calçadas, os pontos de parada, os terminais, a arborização, o policiamento e finalmente a comunicação em tempo real farão com que uma experiência comum e pouco qualificada se transforme em viagens atraentes e, pouco a pouco, mude a afetividade da escolha desse meio. Enquanto o automóvel não precisa de uma cidade ótima para todos, o ônibus, ao mesmo tempo, exige e deixa de herança esses benefícios.

Enfim, e isso é um benefício adicional da mobilidade por ônibus, a cidade precisa melhorar para todos, pedestres, ciclistas, idosos e pessoas com necessidades especiais, para que todos, sejam usuários ou não, possam apreciar esse velho novo companheiro de forma mais romântica.

Informações: NTU

READ MORE - O que falta para a mobilidade sobre ônibus ser atrativa?

Tarifa zero: política social ou modismo?

domingo, 2 de junho de 2024

A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) produziu um relatório técnico, intitulado Tarifa zero nas cidades do Brasil, disponibilizando dados, informações e análises referentes à adoção dessa medida no transporte público das cidades brasileiras, um movimento que se iniciou na década de 1990 e que foi adotado na cidade de Conchas, no interior do estado de São Paulo, em 1992. Atualmente, existem 124 cidades brasileiras operando suas frotas de ônibus sem o pagamento de tarifas, sendo que 106 cidades (85%) praticam a tarifa zero de forma plena — ou seja, em todos os dias da semana e em todas as linhas de ônibus do município.
Tarifa Zero dobrou o número de usuários em São Caetano

Vale ressaltar que 89 cidades (72% do total) adotaram essa política nos últimos quatro anos, depois do período da pandemia, e que, na maior parte dos casos, são municípios pequenos, com população total inferior a 50 mil habitantes (63%), que conseguem um espaço orçamentário para financiar a totalidade da prestação do serviço de transporte coletivo. As três maiores cidades que adotaram a tarifa zero são Caucaia, no Ceará, com uma população de cerca de 350 mil habitantes, desde setembro de 2021; Luziânia, em Goiás, com 208 mil habitantes, desde novembro de 2023; e Maricá, no Rio de Janeiro, com uma população de 197 mil habitantes, que começou a prática da tarifa zero em 2014, mas ampliou a medida para toda a cidade somente em 2021.
A tarifa zero gera uma situação totalmente nova para os deslocamentos urbanos, principalmente no que se refere às mudanças de hábitos da população, com reflexos no aumento da demanda, bem como na necessidade de acréscimo no número de veículos alocados à operação. Há, ainda, a inevitável elevação dos custos operacionais na prestação dos serviços de transporte e a necessidade de maior aporte de recursos por parte do poder público local — na maioria dos casos, provenientes do orçamento municipal. Aliás, esse é o modelo de financiamento utilizado por quase todas as cidades que adotaram a tarifa zero.

Em algumas cidades em que o transporte público por ônibus é subsidiado de maneira integral, foram criados fundos municipais para garantir as condições financeiras para o custeio e para os investimentos em controle, operação, fiscalização e planejamento dos programas de tarifa zero. Esses fundos têm como fonte de receita dotações orçamentárias, recursos do município e repasses estaduais ou federais, além de arrecadações provenientes de estacionamentos rotativos, multas de trânsito, exploração de espaços publicitários, entre outras atividades.

Na maioria das cidades que adotou a tarifa zero, os recursos necessários comprometem, no máximo, 3% do orçamento anual do município. Em cidades com população superior a 1 milhão de habitantes e com uma frota de centenas de ônibus, o comprometimento do orçamento público pode chegar a 5% ou mais. Já na cidade de São Paulo, com uma população de cerca de 12,5 milhões de habitantes e uma frota operacional de quase 12 mil veículos, de 15 a 20% do orçamento municipal poderão ser comprometidos, sem receitas extraordinárias ou com origem em novas fontes de custeio.

A adoção da tarifa zero é uma política pública, inclusiva e de caráter social, que promove a organização do espaço urbano e a racionalização do uso do sistema viário, principalmente pelo aumento do uso do transporte coletivo. Mas a tarifa zero não garante a prestação de um serviço de qualidade à população. Quando o aumento da oferta de lugares não acompanha o inevitável crescimento da demanda, verifica-se uma superlotação dos veículos e uma perda significativa do nível do serviço.

Em um ano eleitoral, quando alguns candidatos ao cargo de prefeito não medem esforços para prometer o que, depois, não poderá ser cumprido, certamente a tarifa zero não deve ser vista como uma solução para os problemas de transporte das cidades ou proposta por puro modismo.

por Francisco Christovam
Diretor-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, vice-presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo e da Associação Nacional de Transportes Públicos 

Informações: Correio Braziliense
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