Se ainda não dá para fugir da má qualidade do serviço de transporte público no Rio, pelo menos o passageiro já consegue escapar do dragão da inflação numa embarcação ou num trem lotado. Dois anos após a sua implantação, o Bilhete Único se mostra uma alternativa indispensável contra o aumento das tarifas. Desde fevereiro de 2010, o BU sofreu reajuste de 12,5%, contra aumentos nos transportes de 14,3% a 60,7% no mesmo período. Em todo o governo Sérgio Cabral, a variação do valor das passagens superou a inflação acumulada, de 16%, de acordo com o IPCA para transportes, medido pelo IBGE.
Desde que o BU foi lançado, o índice acumulado é de 12,66%. No resto do Brasil, a média da alta no custo do transporte ficou em 7,44%, quase a metade da taxa fluminense.
Ao todo, 2,2 milhões de pessoas têm o BU, mas 600 mil ainda pagam a passagem em dinheiro no trem, no metrô, nas barcas e nos ônibus intermunicipais. Uma empregada doméstica sem BU e com o salário mínimo da categoria (R$ 729) pagaria mais R$ 50,60 na SuperVia e na Metrô Rio em 22 dias de trabalho. Esse gasto a mais por não ter o bilhete representa 6,90% dos seus ganhos.
— Essa diferença representa um peso maior do transporte no orçamento doméstico. O que isso pesa em cada família depende do que cada uma delas recebe — diz o economista Gilberto Braga, do Ibmec.
Segundo o secretário estadual de Transportes, Julio Lopes, a meta é universalizar o uso do Bilhete Único e abolir os pagamentos em dinheiro na hora de passar na roleta.
— Queremos chegar ao ponto de todo mundo usar o BU. Isso facilita o nosso controle sobre os custos das empresas e sobre o fluxo real de passageiros. Sem falar na economia no fim do mês — diz.
Desse universo de usuários, no entanto, só 21% o usam diariamente. No futuro, o sistema poderá ser ajustado para permitir uma carga tarifária social mais justa, conforme os rendimentos do passageiro.
— O Banco Mundial considera o nosso sistema o melhor do mundo. Tanto que nos encomendou um estudo para adequar o perfil do usuário de acordo com os seus ganhos. Isso é possível graças ao CPF. Assim, no futuro, quem ganha menos, pagaria menos ainda. E quem ganha mais, pagaria um pouco a mais também — afirma Julio Lopes.
Empresário contrata até gente em Niterói e se cadastra no BU para cortar custos
Um exemplo de como a inflação devorou as economias e a paciência dos passageiros vem da Barcas S/A. Após o reajuste de 60,71% na tarifa, Giorgio Antunes, dono de uma consultoria, teve que recalcular a sua folha de pagamento e a logística da empresa, no Centro do Rio.
— Temos quatro clientes em Niterói e, todos os dias, dois funcionários iam e voltavam de lá. Passei a mandar apenas um, e contratei outro que mora do outro lado. Fora isso, cadastramos todos os funcionários no Bilhete Único, inclusive eu, que moro em São Paulo e venho constantemente ao Rio e a Niterói — conta ele.
Segundo a Barcas, o número de passageiros cresceu a partir do BU. No fim de 2009, eram 79,2 mil por dia. Hoje, são 92,9 mil. Ou 17,3% a mais. Mesmo com o bilhete, há queixas. A SuperVia e a Metrô Rio deram fim à integração promocional que mantinham há 12 anos, adotando o BU. Assim, a tarifa pulou de R$ 4,20 para R$ 4,95.
— Meu último aumento foi em maio passado, de cerca de 6%. Como vou utilizar o trem e o metrô integrado, que me auxiliava muito, com um aumento de cerca de 17%? — reclama a técnica de enfermagem Elizabete Guerra, de 54 anos.
Do outro lado da roleta, até os empresários já aprovam o BU.
— No início, o BU gerou queda de receita de 15%. Mas isso vem sendo compensado com o aumento do número de passageiros, de quase 8% — conta Paulo Valente, diretor da Viação Santa Maria.
Em Sáo Paulo, o Bilhete Único teve reajustes de 42, 85% desde o seu lançamento, em 2006. À época, valia R$ 2,10. Hoje, o benefício custa R$ 3.