Os reajustes e a nova política de cobrança que criou as bandeiras tarifárias – que eleva o custo da energia em função das condições de geração de eletricidade – representam um acréscimo médio de 90% nas contas de luz dos operadores metroferroviários. A diferença é contabilizada desde outubro de 2014 até março deste ano.
O impacto é significativo, já que esse é um dos principais custos operacionais do transporte de passageiros sobre trilhos. O outro é com pessoal, o que também preocupa as empresas, já que o governo deve reduzir o benefício da desoneração fiscal sobre a folha de pagamento. A medida ainda precisa passar pelo Congresso Nacional, mas foi anunciada como uma das soluções para elevar a arrecadação e ajudar a equilibrar as contas da União.
O cenário preocupa o setor, que prevê risco de demissões e redução de investimentos, além da necessidade de aumentar as tarifas para compensar a alta nas despesas. A superintendente da ANPTrilhos, Roberta Marchesi, falou à Agência CNT de Notícias sobre o tema.
Com relação à energia elétrica, ocorreram diversos aumentos e mudanças na política de cobrança. Como isso está afetando os custos operacionais do transporte de passageiros sobre trilhos?
Nosso setor já vinha sendo impactado de forma dura com todas as alterações de tarifas de energia e de regras definidas pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Somados a isso, tem o reajuste anual das operadoras, os reajustes extraordinários que vieram e o sistema de bandeiras tarifárias. Se considerarmos todas as altas entre outubro do ano passado e a última semana, temos quase 90% de aumento real na conta de energia.
Os operadores conseguem compensar essas perdas de alguma forma?
Não. Alguns reajustes de tarifas aos usuários já foram dados no final do ano passado. Além disso, os Estados, que em alguns casos subsidiavam parte do valor, também estão enfrentando dificuldades financeiras. O Rio de Janeiro, por exemplo, decidiu cortar. Lá, a defasagem da tarifa é de 20%, fora esses impactos recentes. O maior problema é que isso afeta o bolso do cidadão. Como explicar que esse não é um problema que o setor precisa lidar, mas sim o governo? O governo precisa definir que o setor de mobilidade urbana tem que ser prioritário e sinalizar isso.
Hoje, temos dois benefícios fiscais: desoneração da folha, que valeu por um ano – e o setor contratou muita gente por isso – e isenção de PIS/Cofins. A desoneração deve cair pela metade. Então, que tipo de sinal o governo está dando? Que tipo de prioridade, nas políticas que cria, dá para a mobilidade como um todo? Esse é o grande problema e que vai prejudicar toda a sociedade.
Hoje, temos dois benefícios fiscais: desoneração da folha, que valeu por um ano – e o setor contratou muita gente por isso – e isenção de PIS/Cofins. A desoneração deve cair pela metade. Então, que tipo de sinal o governo está dando? Que tipo de prioridade, nas políticas que cria, dá para a mobilidade como um todo? Esse é o grande problema e que vai prejudicar toda a sociedade.
Quais repercussões esse cenário pode gerar?
O grande problema é que o orçamento é limitado para o custeio das operações. Se a despesa aumenta, vamos cortar de onde? O pior exemplo que nós temos é o da Argentina, que congelou por anos a tarifa e cortou na manutenção do sistema. Porque é isso que ocorre: primeiro você para de investir, de crescer e de comprar trens novos. Depois, os cortes são na manutenção. E a Argentina teve casos drásticos de acidentes, inclusive com vítimas fatais. O maior medo é que cheguemos a esse momento, por não termos como custear essa operação. Sabemos da situação crítica que estamos passando, mas não se pode deixar de olhar para setores fundamentais da economia. E a mobilidade o é.
Entre as medidas adotadas pelo governo federal para recompor o caixa da União está a redução de benefícios fiscais sobre a folha de pagamento a um conjunto de setores da economia, entre os quais o de transporte de passageiros sobre trilhos, já destacado por você. Como a ANPTrilhos recebeu a medida?
O setor metroferroviário foi um dos últimos a ser inserido na política de desoneração e tivemos apenas um ano de aplicação efetiva, que foi em 2014. O valor era fundamental para repor perdas acumuladas com alterações na política energética e permitia um equilíbrio parcial. Além disso, os operadores contrataram mais, apostando na desoneração da folha. Nós tivemos um incremento de 12% nos postos de trabalho, na contramão do que estava ocorrendo no Brasil. Então, essa notícia vem pra gente de uma forma muito negativa. Somente os três maiores operadores nacionais contabilizam uma perda em investimentos da ordem de R$ 73 milhões só para este ano, por conta do aumento da contribuição sobre a folha. É uma medida muito ruim diante do cenário brasileiro na economia e na mobilidade urbana, em especial.
Isso tudo pode impactar em termos de qualidade, demissões e em tarifas?
Isso pode ocorrer e não somente no caso de operadores privados. Ainda que os operadores públicos não possam demitir, porque são profissionais concursados, postos que seriam abertos ou que estavam em aberto serão fechados. Quer dizer, não há como expandir força de trabalho na situação que nós estamos hoje, com o governo dando sinais claros de que não auxiliará esses setores econômicos. Precisamos que essa política seja revista. Os recursos humanos são o maior custo operacional das empresas, quando não o primeiro, juntamente com a energia elétrica. São dois centros de custo críticos para o operador metroferroviário. Juntos, representam praticamente 70% de todas as despesas e, em alguns casos, até mais.
Da Agência CNT de Notícias