A cena é corriqueira: veículos não autorizados — principalmente motos — invadem as pistas exclusivas do BRT para escapar do engarrafamento. Pedestres também cortam caminho pelos corredores. O atalho ilegal provocou a morte nesta terça-feira da estudante Fernanda Vitória Cavalcante Alves, de 17 anos, atropelada por um carro oficial do governo do estado na calha do Transcarioca, em Campinho. Levantamento feito pela empresa da prefeitura Mobi-Rio, responsável por administrar o sistema BRT, mostra que este ano já foram registrados 58 acidentes nos 157,5 quilômetros de extensão dos quatro corredores exclusivos na cidade — uma média de duas colisões a cada três dias. No ano passado, foram 226 ocorrências.
Todos os acidentes foram provocados pela imprudência de motoristas que invadiram as pistas dos ônibus articulados, fizeram conversões proibidas ou avançaram algum sinal do sistema. A Mobi-Rio estima um gasto de R$ 110 mil nos últimos 15 meses para reparar os ônibus danificados nessas colisões, isso sem contar o tempo que os coletivos ficam fora de operação — que varia de um a quatro dias. Dos quatro BRTs, o Transcarioca aparece na estatística com a maior quantidade de batidas: 37 este ano. Em 2024, foram 103.
Farra de infrações
Nesta quarta-feira, 24 horas após a morte de Fernanda Vitória, uma equipe do GLOBO ficou por três horas no corredor Transcarioca (Barra-Galeão), onde a jovem foi atropelada, após sair da Escola Estadual Professora Maria Terezinha de Carvalho Machado. Foi o bastante para flagrar uma farra de irregularidades praticadas por motociclistas, motoristas e até por quem pedalava. Apesar da sinalização, veículos sem autorização foram vistos circulando pela calha exclusiva. Em alguns casos, pedestres também atravessaram as pistas fora das faixas reservadas para passagem de pessoas. A Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio) não divulgou o número de multas aplicadas nos quatro corredores do BRT.
Além dos ônibus articulados, de acordo com o Código Brasileiro de Trânsito, só podem trafegar pelos corredores do BRT os veículos destinados a socorro de incêndio e salvamento, ambulâncias, carros de polícia e veículos de fiscalização e operação de trânsito. A invasão da calha é considerada uma infração gravíssima: a multa é de R$ 293,47, e o motorista perde sete pontos na carteira.
Fernanda Vitória foi atingida por um carro que prestava serviços para a Secretaria estadual de Cultura. Segundo o órgão, o motorista Marco André Vargas, que dirigia o automóvel, estava sozinho no carro. Ele foi exonerado após o acidente e, na Polícia Civil, vai responder por homicídio culposo (sem intenção de matar).
Em julho de 2022, outra imprudência tirou a vida do garçom Rhenê Rodrigues Martins. A vítima atravessava a pista do BRT Transoeste, na Barra da Tijuca, na faixa de pedestres, quando foi atropelado por um carro da prefeitura em alta velocidade. O motorista Felipe Zelino Vitório Moitinho não prestou socorro. De acordo com o RJ2, da TV Globo, até hoje a família de Rhenê não foi indenizada pelo município. O garçom era casado e tinha três filhos.
Quase um ano depois, o motorista foi denunciado por homicídio doloso (com intenção de matar). Na época, o Ministério Público do Rio entendeu que ele transitava com veículo do município sem placa e pela pista expressa do BRT, sem que houvesse qualquer urgência. A promotoria também apontou que ele ultrapassou o sinal vermelho, não prestou socorro à vítima e falsificou documentação para dificultar a investigação.
Até mesmo o carro do deputado Dionísio Lins (PP), então presidente da Comissão de Transportes da Assembleia Legislativa, foi flagrado em março de 2023 trafegando pelo Transcarioca. Na época, o parlamentar se justificou dizendo que estava verificando a “situação do piso”.
Informações: O Globo
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