A desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira, plantonista da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), decidiu permitir os piquetes criados pelos rodoviários de Porto Alegre para impedir que seus colegas furem a greve.
Ela cassou a liminar do juiz do Trabalho Elson Rodrigues da Silva Junior, da 10ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, que havia determinado aos grevistas a liberação da saída dos ônibus nas garagens em um prazo de 48 horas.
A decisão é deste domingo. No fim da tarde, a magistrada acatou mandado de segurança impetrado por Alceu da Silva Weber, da Comissão de Negociação de Greve dos rodoviários.
— A greve é um legítimo direito potestativo da categoria profissional, cujo exercício pressupõe a liberdade de trabalho e de convencimento dos trabalhadores à adesão ao movimento paredista. Os piquetes são instrumentos legítimos de convencimento na adesão à greve.
Com a nova decisão judicial, a Brigada Militar não vai retirar os piqueteiros da porta das empresas.
O gerente-executivo da Associação de Transportadores de Passageiros (ATP, que congrega as empresas de ônibus da Capital), Luiz Mário Magalhães Sá, se diz "perplexo" com a decisão judicial.
— Como uma greve ilegal pode ter seu instrumento mais violento, o piquete, legalizado? Nosso setor jurídico estuda medidas. Queremos restabelecer o transporte na cidade — ressalta.
Confira o texto da decisão:
Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato que, nos autos do interdito proibitório n. 020130-57.2014.5.04.0010, deferiu a liminar requerida para determinar "a suspensão da prática de todos os atos que estão a molestar a posse legítima das empresas representadas pelo autor, com a retirada dos piquetes das portas/portões das garagens das empresas de ônibus, de modo a permitir a saída dos ônibus das garagens, no prazo de 48 horas a contar da intimação desta decisão, sob pena de, se necessário for, ser determinada a utilização de força policial para assegurar o direito das empresas representadas pelo autor e o respeito à ordem jurídica" bem como para fixar "multa de R$100.000,00 em favor do autor por dia de descumprimento da presente decisão, sem prejuízo de haver determinação para que a decisão seja cumprida com utilização de força policial."
O impetrante discorre acerca das razões que levaram ao movimento paredista. Transcreve a decisão objetada na presente ação mandamental e alega que afora vaga alegação de vandalismo, não há qualquer comprovação ou mesmo indício do uso de violência ou força pelos grevistas. Invoca o disposto no artigo 678, I, e 865 da CLT, bem como o artigo 30, letra "e" do Regimento Interno deste Tribunal, para sustentar a incompetência da autoridade dita coatora para exame da matéria que culminou no ato atacado. Sustenta que a greve é um direito constitucionalmente assegurado, mas fundamentalmente um fato social. Afirma que o piquete é da essência da greve e reconhecido em lei, destinado a transmitir a toda a categoria a decisão amplamente majoritária de fazer a greve. Aduz que, enquanto a assembleia não votar pelo fim da greve, é direito dos grevistas continuar na frente das empesas para assegurar que a maioria continue a prevalecer. Diz não ser factível escudar na vontade da minoria o desrespeito à vontade de toda a categoria. Afirma que nada pode ser invocado para garantir que os poucos que querem trabalhar possam fazer ir por água abaixo o trabalho da grande maioria que quer permanecer parada, muito menos a polícia. Argumenta que, se fosse possível o ajuizamento de interdito proibitório no caso concreto, serviria apenas para assegurar a posse dos prédios das empresas, tendo sido concedido no ato coator um efeito mais amplo. Sustenta que a existência de um despacho que não decretou a ilegalidade da greve e, sim, apenas estatuiu a abusividade do fato de não se cumprir com uma medida liminar, não pode servir de fundamento à decisão aqui atacada. Ressalta que a ilegalidade ou não da greve será julgada em 17 de fevereiro, podendo o Tribunal até lá rever sua decisão precária de considerar a greve ou determinada prática dos grevistas como abusiva. Assevera que a categoria estará reunida na tarde da próxima segunda-feira, cabendo à assembleia definir os rumos da greve. Informa que o sindicato já anunciou que pedirá o fim do movimento paredista e que o comando da greve defende aguardar o julgamento do dia 17. Diz que, assim, permitir o uso da força policial contra os trabalhadores no dia de sua reunião mais importante, em nada ajuda para a solução do problema, além de perturbar a ordem ao invés de impedir dita perturbação. Conclui, por fim, ter demonstrado amplamente o fumus boni iuris e, quanto ao periculum in mora diz se expressar no fato de que o cumprimento da ordem impugnada na segunda-feira pela manhã pode levar a uma espiral de violência incontrolável. Requer a concessão de medida liminar para cassar o ato atacado ou, sucessivamente, suspender seus efeitos até a conclusão da assembleia de segunda-feira.
Examino.
A greve é um legítimo direito potestativo da categoria profissional, cujo exercício pressupõe a liberdade de trabalho e de convencimento dos trabalhadores à adesão ao movimento paredista, bem assim, do restante da sociedade que, em última análise, também se beneficia com eventual conquista que atenue as desigualdades sociais, em especial a de classes. Nesse sentido, o disposto no artigo 6º, inciso I, da Lei 7.783/89 que assegura aos grevistas, dentre outros direitos, "o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve".
Os piquetes são o cerne da controvérsia e do qual decorrem todas as repercussões definidas no ato coator (multa e utilização de força policial). Todavia, como antes se definiu, os piquetes são instrumentos legítimos de convencimento na adesão à greve. Nesse ponto, conquanto não se configure a alegada incompetência do juízo para o exame do interdito proibitório, não se pode olvidar que o movimento paredista em questão é objeto de análise em duas outras ações (dissídio coletivo de greve e ação cautelar intentada pelo Município de Porto Alegre) em que houve já definição acerca de percentuais da frota a serem colocados nas ruas e as repercussões em caso de descumprimento, bem assim acerca da inviabilidade de se determinar o uso da força policial. Assim, pretensões no sentido daquelas formulados na demanda subjacente seriam melhor examinadas nos autos das ações já em curso.
Há que levar em conta, ainda, haver o impetrante protocolado requerimento de nova reunião de mediação (ID 274139) de sorte que a utilização de força policial mais que contribuir para uma solução negociada do conflito coletivo, pode ao revés, acirrar os ânimos.
Defiro, portanto, o pedido liminar para cassar a decisão que nos autos do interdito proibitório n. 020130-57.2014.5.04.0010, determinou "a suspensão da prática de todos os atos que estão a molestar a posse legítima das empresas representadas pelo autor, com a retirada dos piquetes das portas/portões das garagens das empresas de ônibus, de modo a permitir a saída dos ônibus das garagens, no prazo de 48 horas a contar da intimação desta decisão, sob pena de, se necessário for, ser determinada a utilização de força policial para assegurar o direito das empresas representadas pelo autor e o respeito à ordem jurídica" e que fixou multa para o caso de descumprimento.
Intime-se o impetrante e oficie-se à autoridade dita coatora acerca da presente decisão.
Após, encaminhe-se o feito à regular distribuição.
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