RIO - A estudante universitária Julianne Carvalho, de 22 anos, e o operador de telemarketing Luiz Gustavo Braga, de 27, não se conhecem, mas dividem o mesmo drama todas as manhãs: trens superlotados e ônibus parados em congestionamentos. Hoje, o Rio tem 2,5 milhões de usuários diários de ônibus, 390 mil de trens, 645 mil de metrô e um milhão nas vans. Para os motoristas de carro, a situação não é melhor. A frota atual, segundo o Detran, é de 2,57 milhões de veículos, sendo 1,9 milhão de automóveis. Estudo feito pela Coppe/UFRJ estima que, se o aumento de veículos continuar na mesma medida, a cidade poderá ter um carro para cada duas pessoas em 2020.
Nesse horizonte, os principais candidatos à prefeitura do Rio discutem como melhorar o transporte público levantando, entre suas propostas, a antiga bandeira da integração entre os transportes de massa. Todos, porém, estão longe de uma solução para a mobilidade urbana. Essa é, pelo menos, a opinião de especialistas ouvidos pelo GLOBO.
- As propostas são um pouco desconectadas porque o objetivo é satisfazer os diversos segmentos com potencial de voto. Então, não há uma coerência de um planejamento integrado - criticou o professor de Engenharia de Transporte da PUC-Rio José Eugênio Leal.
José Guerra, pesquisador de Engenharia de Transportes da Uerj, concorda e ressalta que as ideias apresentadas precisavam ser organizadas em uma rede de transporte. Para ele, as propostas ainda não se encaixam.
- A próxima prefeitura deveria propor uma lei para uma rede integrada estrutural básica, fazer isso ser aprovado na Câmara Municipal e definir cada segmento. Definir onde deverá ter metrô, trem, ônibus de alta ou média capacidade, ônibus de baixa ou média capacidade - explicou Guerra.
Sistema atual não é otimizado
Paulo Cezar Ribeiro, pesquisador da Coppe que fez o estudo já citado sobre aumento da frota, também critica as imprecisões dos candidatos:
- Bato nessa tecla há mais de dez anos: é preciso reorganizar as linhas de ônibus. O sistema não foi otimizado para ser integrado. Essa integração não existe, fala-se nisso há décadas, e ninguém mexe (nisso)- afirmou Ribeiro, para quem os ônibus são o ponto de partida para organizar o sistema como um todo.
A opinião de quem utiliza trem, metrô e ônibus não é diferente. Luiz Gustavo Braga, de 27 anos, mora em Guaratiba e sente na pele a dificuldade de chegar ao trabalho no Centro.
- O BRT é interessante, mas muito cheio, e eu demoro mais tempo para vir até o Centro de ônibus. Então prefiro ir de trem. Só que a infraestrutura é ruim. Semana passada teve um princípio de incêndio em uma composição - opinou Braga.
Julianne Carvalho, de 22 anos, estuda Medicina no Centro e precisa de mais de duas horas para chegar à faculdade.
- Eu pego um ônibus e o trem parador, se eu pegasse o direto, eu chegaria mais cedo, mas é muito cheio - contou Julianne, que elogiou a criação do Bilhete Único, mas ressaltou que o tempo de validade (duas horas) é um prazo curto.
Há mais de 20 anos as propostas para a área de transporte são bastante semelhantes: integração e reorganização das linhas de ônibus, investimentos no metrô e até a construção de um Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). A última administração da prefeitura inaugurou o corredor Transoeste (Barra da Tijuca-Santa Cruz) e criou 27km de faixas exclusivas para circulação de ônibus e táxis da Tijuca à Zona Sul, o que teria eliminado 30% das linhas de ônibus entre Copacabana e Leblon e 15% no Centro.
E é com essa orientação que o atual prefeito e candidato à reeleição pelo PMDB, Eduardo Paes, pretende continuar. O objetivo é concluir a construção dos três corredores de ônibus Transcarioca (Barra da Tijuca-Galeão), Transolímpica (Deodoro-Barra) e Transbrasil (Deodoro-Centro). Outro objetivo é a inclusão do metrô, das barcas e das vans no Bilhete Único, que atualmente integra apenas os ônibus e os trens. Segundo a prefeitura, o metrô não suportaria, neste momento, o aumento da demanda se fosse integrado ao bilhete.
- Não há espaço para tanto carro. Não vou investir em obra viária. À medida que você cria transporte de qualidade, você racionaliza o sistema, e as vans vão funcionar como alimentadoras - observou Paes, que não pretende aumentar o horário do bilhete, diferente de seus adversários.
Já o candidato do PSOL, Marcelo Freixo, quer fazer uma revisão da licitação dos ônibus, feita pela atual administração em 2010 e alvo de crítica do Tribunal de Contas do Município (TCM), por indícios de formação de cartel.
- Rever a licitação, com uma auditoria, é a primeira medida. Se constatar o problema, vamos refazê-la. A nova licitação tem que garantir que empresas de outras cidades possam participar, não só as mesmas - apontou Freixo.
Rodrigo Maia (DEM) diz que, se eleito, a política que norteará o setor de transportes é a do investimento no metrô e nos trens, no lugar da construção da Transbrasil.
- Uma das principais propostas é não deixar que um sistema de massa já ativo venha competir com um terceiro para os ônibus - diz Maia, sobre o BRT da Transbrasil. - Eles são paralelos, vão competir um com o outro. O que vai acontecer? O ônibus não vai ter capacidade de levar o número necessário de pessoas, e os outros modais de massa vão deixar de investir porque vão perder competitividade e é muito mais interessante que parte desse dinheiro, não todo, esteja investido em trens e metrô nesses ramais da Avenida Brasil.
Em seu primeiro mandato na prefeitura, Cesar Maia fez uma proposta semelhante à do filho e até obteve autorização da Câmara Municipal para o repasse de R$ 60 milhões. O dinheiro, no entanto, nunca chegou ao estado, responsável pela expansão.
O candidato Otavio Leite (PSDB) pretende começar o mandato evitando a polêmica derrubada do Elevado da Perimetral, na Zona Portuária.
- Queremos repactuar o projeto do Porto Maravilha, decretar a permanência do Elevado da Perimetral e fazer um concurso público paisagístico para que ele se incorpore ao projeto.
Na análise dos especialistas, tanto a derrubada quanto a proposta do candidato ainda precisam ser aprofundadas, especialmente por causa do impacto no transporte público.
Eduardo Paes:
Veículo leve sobre trilhos (VLT): Queremos implantar no Centro da cidade o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), integrado ao metrô, aos trens e às barcas.
Paulo cezar ribeiro (coppe): O VLT é um projeto antigo para a cidade, desenvolvido pelo
IPP, que traria benefícios à circulação no Centro da cidade, desde que haja uma reorganização das linhas de ônibus na área de influência desse sistema.
Marcelo Freixo:
Bondinho: Iniciar tratativas com o governo do estado para fazer a municipalização do bondinho de Santa Teresa, revitalizando e conservando os antigos bondes, recuperando-os como patrimônio histórico e cultural.
José Eugênio Leal (PUC): Creio que o bondinho de Santa Teresa deve fazer parte de um sistema de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) já proposto para o Centro da cidade.
Rodrigo Maia:
Transporte alternativo: Garantir a integração do transporte alternativo (vans) na cidade aos demais sistemas de transporte urbano existentes no Rio.
Jaques Sherique, diretor do crea-rj: O transporte alternativo deve ser muito bem regulamentado e controlado para poder permitir que tal integração funcione no Rio.
Otavio Leite:
VLT na Barra: Sugerir ao estado que a Linha 4 do metrô vá do Jardim Oceânico até o Trevo das Américas com a Ayrton Senna. Em caso contrário, implantar um VLT no canteiro central da Avenida das Américas, na Barra.
Jaques Sherique, diretor do CREA-RJ: Importante e necessário. Assim, teríamos a integração desses dois tipos de transporte de massa que estão separados por poucos quilômetros atualmente.
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