Trânsito congestionado, poluição, gastos com combustível, seguro e manutenção. Muitos são os motivos para trocar o carro pelo transporte público em São Paulo, mas o que se vê na prática é uma frota crescente de automóveis nas ruas da cidade.
A resposta para o paradoxo é dada por uma pesquisa que traduz em números o que moradores de áreas afastadas do centro percebem no dia a dia: é mais rápido chegar à maior parte dos postos de trabalho se o trajeto for feito de carro.
Elaborado pelo Instituto Cidades Responsivas, o Indicador de Mobilidade Urbana aponta que o carro permite ao paulistano acessar quatro vezes mais postos de trabalho em um tempo de deslocamento de até 45 minutos em comparação ao transporte público, considerando ônibus e metrô.
Transformando isso em um índice, o automóvel tem uma nota 1,03, sendo que 1 representa a existência de vagas de emprego em quantidade similar à de residências. Já o indicador do transporte público é de 0,23.
O automóvel ainda alcança sete vezes mais empregos no mesmo intervalo quando o trajeto considera áreas em que o ônibus é a única opção de transporte público. Ou seja, neste caso, o indicador do ônibus é de 0,14. É o segundo pior do Brasil entre as capitais avaliadas, perdendo apenas para o Rio de Janeiro, cujo índice é de 0,13.
A eficiência média do carro cai quando comparada ao metrô de São Paulo, que tem indicador de mobilidade de 0,41. Mesmo assim, o veículo individual ainda alcança duas vezes mais empregos do que se o percurso fosse realizado pelos trilhos.
O estudo contabiliza os postos de trabalho acessíveis em deslocamentos de até 45 minutos a partir de residências localizadas em São Paulo e em outras sete capitais brasileiras.
Para chegar aos índices, pesquisadores cruzaram dados do Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos, do IBGE, e da Rais (Relatório Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho. O estudo não considera empregos informais.
O tempo dos deslocamentos realizados entre 6h30 e 8h em dias úteis foi obtido a partir de simulações feitas nas plataformas Mapbox, para os realizados com automóveis, e de rotas do Google, para o transporte público.
A explicação para tamanha vantagem do automóvel está no histórico do planejamento urbano da cidade, especialmente pela construção das marginais dos rios Tietê e Pinheiros, segundo os responsáveis pela pesquisa.
Cortando a capital de leste a oeste e de oeste a sul, esses eixos rodoviários tornam significativamente mais postos de trabalho acessíveis em intervalos mais curtos para quem mora longe do centro expandido, segundo Guilherme Dalcin, cientista de dados do Instituto Cidades Responsivas.
Desenvolvida para privilegiar o transporte individual, a malha viária de São Paulo possibilita não somente alcançar de carro mais áreas distantes em até 45 minutos dentro da cidade, mas também destinos em municípios vizinhos.
Também joga a favor do automóvel a concentração de empregos em poucas áreas da cidade em contraposição à maior presença de moradias nas periferias, segundo a diretora do Cidades Responsivas, Luciana Fonseca. “Há lugares com mais empregos e com o carro você vai direto para eles”, comenta.
São exemplos disso as regiões das avenidas Brigadeiro Faria Lima e Engenheiro Luiz Carlos Berrini. Localizadas no eixo da marginal do rio Pinheiros, entre as zonas oeste e sul da capital, as vias são dois grandes polos geradores de empregos, mas possuem baixa oferta de metrô.
O crescente número de carros chegando às ruas de São Paulo anualmente, enquanto a frota de ônibus vem caindo, reflete a percepção da população quanto à baixa eficiência dos meios coletivos.
Em 2010, a frota de ônibus da capital era de 15.003. Esse número vem diminuindo ano a ano e, em 2023, chegou a 13.300, segundo dados da São Paulo Transportes compilados pela Secretaria Municipal de Urbanismo.
Existem menos ônibus porque o número de passageiros também é menor. Os embarques diários caíram de 10 milhões para 7,3 milhões, segundo a prefeitura.
No mesmo intervalo, a quantidade de automóveis subiu de 5 milhões para 6,2 milhões, de acordo com números do Detran, também organizados pelo setor de urbanismo da prefeitura.
Se por um lado o uso do carro parece eficiente para o cidadão, por outro, a escolha é ruim para a eficiência da cidade.
Mudar essa lógica depende do planejamento urbano. Para Fonseca, São Paulo deu passos na direção certa ao aprovar, em 2014, e manter, em 2023, um Plano Diretor que estimula construções de residências e postos de trabalho próximos ao transporte público.
A pesquisadora ainda destaca que aproximar moradias do trabalho não é a única estratégia para tornar a cidade mais compacta. Ela defende a criação de postos de trabalho em áreas com grande concentração de moradias e revisões em intervalos mais curtos do planejamento urbano para correções mais certeiras do crescimento das cidades.
Nesse sentido, Fonseca diz ser positivo que o planejamento paulistano, refeito a cada 15 anos, conte com uma revisão intermediária. “Acho que é preciso ler a cidade em tempo real, e o Plano Diretor de São Paulo tem essa preocupação”, diz.
Sobre a eficiência do transporte coletivo paulistano, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) diz ter melhorado o sistema com ônibus maiores e mais modernos, além de ter implantado 54 quilômetros de faixas exclusivas e ter inaugurado o transporte aquático na represa Billings.
A Secretaria dos Transportes Metropolitanos, subordinada ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), afirma ter quatro linhas de metrô e trem em obras que vão garantir 20 novas estações e mais 24,7 quilômetros de trilhos.
CLAYTON CASTELANI / Folhapress
Informações: Folha de São Paulo
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