Nesta segunda-feira, o jornal Libération dedicou duas páginas aos vagões exclusivos para mulheres no metrô carioca, projeto apresentado como uma "vitória". A reportagem ganha vida ao escutar as anedotas dessas mulheres, que enfrentam o empurra-empurra diário nos transportes públicos do Rio de Janeiro. Com números interessantes e um estilo descontraído, a jornalista vai além da informação sobre vagões exclusivos e se interessa pelas histórias das passageiras, coletadas em meio ao balanço do trem, para desenhar a atual situação econômica e social da mulher brasileira.
O sistema de vagões exclusivos ao público feminino foi um projeto de lei votado no dia 8 de março de 2006, dia internacional das mulheres. O Rio de Janeiro é um dos poucos lugares no mundo a implantar esse projeto, junto com outras cidades japonesas e mexicanas, sem contar países muçulmanos, que também praticam a separação por motivos religiosos. Segundo dados do MetroRio, companhia responsável por operar o metrô carioca, as mulheres são maioria entre os usuários do transporte, com 54% do total.
A repórter começa a viagem às 6h15 da manhã na estação General Osório, quando ela encontra Danielle, uma secretária de 34 anos, que a adverte: "Por enquanto não tem muita gente. A separação entre homens e mulheres parece inútil, mas você vai ver que daqui a alguns minutos, quando nos aproximarmos do centro da cidade, o vagão vai lotar imediatamente". A jovem também conta ser desagradável estar em um metrô lotado e ter que enfrentar as "mãos bobas" de alguns rapazes. "A gente nunca sabe como reagir. Então, normalmente, a gente se mantém calada e fica com o coração batendo esperando a hora de descer", confessa.
Entre os argumentos de Michelles, Luzias, Nívias e até mesmo de um Fernando, a jornalista mostra as vantagens em ter um vagão especial para o "sexo frágil", mas também traz depoimentos contrários à iniciativa. É o caso de Jussara, de 46 anos, que considera a lei uma discriminação contra os homens. "Eu nunca me senti insegura dentro do metrô. Eu fico no canto, me apoio sobre a parede e fica tudo bem. Eu não sei porque as mulheres se beneficiam disso e não os homens. Isso é discriminação e não é digno de nosso país", contesta a auxiliar de enfermagem, que passa cerca de duas horas diárias dentro do metrô.
Enquanto descreve a história de brasileiras que enfrentam rotinas pesadas de trabalho, a reportagem do Libération ainda aborda o número de empregadas domésticas usuárias da linha 2 do metrô carioca, o que sublinha a estrutura social do país. E no meio da mulherada, a jornalista encontra um homem que a lança olhares assustados. É um francês que, desavisado, entrou no vagão exclusivo sem perceber a proibição. "É reservado às mulheres? Eu havia reparado que era o único homem. Me perguntei se isso era um sonho ou um pesadelo...", disse o rapaz.
Com a colaboração de Murilo Salviano / RFI
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