No histórico coração da cidade, o relógio recomenda pressa, rumo ao Metrô. À 1h, já é tarde demais. A partir de agora não tem choro nem vela. As estações dos outros trens urbanos também estarão fechadas. A partir de agora, a correria é atrás de ônibus. Nas primeiras horas da manhã, São Paulo chega a ter quase 14 mil ônibus em circulação. No fim da noite, entre 22h e 1h, eles ainda são quase cinco mil. Mas a partir daí, o número cai drasticamente: só 300 continuam circulando. Quem precisa deles, acha pouco. Isabel trabalha como copeira, em festas. “Não tenho horário certo. Se passou do horário é de uma em uma hora. Às vezes não passa, já aconteceu comigo. Para passar o tempo eu fico aqui pensando no horário”, conta. Existem 66 linhas que não param durante a noite. Mas além dos intervalos longos, os destinos são limitados, deixando muita gente no meio do caminho. Quem desembarca em um terminal, já na periferia da cidade, depois de certa hora... “Tinha uma lotação aqui, eu ainda corri, mas não consegui pegar”, afirma o encarregado de produção Evaldo de Souza. Uma avenida corta a região do Morumbi. Nenhum ônibus ou van vai passar nas próximas horas. Para quem não pode pagar táxi, o único jeito de chegar a uma das maiores favelas da cidade é uma longa caminhada. “Só vou voltar umas 4h30, 5h. Dancei”, diz o lavador de carros Hamilton da Silva.
De madrugada no Rio de Janeiro circulam 21% das linhas de ônibus que existem na cidade. Segundo uma resolução da Secretaria Municipal de Transportes, o intervalo entre os ônibus nos pontos pode ser até de uma hora. Filas enormes, disputa pelos ônibus. Tudo isso à 1h, horário do rush para quem busca a última chance. “Fazer o que? Eu não posso ir a pé. É bem longe”. “Não é qualquer dia que a gente tem R$ 4,00 para pegar uma van”. O horário da correria na Central do Brasil é um pouco mais cedo. Os últimos trens partem pouco antes das 23h. “Se eu perder esse trem, só amanhã”. O trem sai e para. Os atrasados ficam na expectativa, mas as portas não abrem de novo. “Corri muito, mas não deu tempo”. As portas da estação fecham a meia-noite em ponto. A justificativa é a necessidade da parada para a manutenção. Mas na opinião do especialista em transportes Fernando Mac Dowell seria possível prolongar o metrô até às 2h. “É uma questão meramente de planejamento, e ter gente competente para fazer esse tipo de trabalho”, afirma.
Na maior estação de ônibus urbanos de Salvador, no Centro, passam mais de 400 mil pessoas durante o dia. Já na madrugada o terminal é um retrato do transporte coletivo na capital baiana entre 0h e 4h: praticamente não existe. São apenas 13 ônibus fazendo o chamado “pernoitão”. Quase nada para uma cidade de três milhões de habitantes. A população da periferia é a que mais sofre. “Eu saí do trabalho à 0h. Cheguei na estação 1h30, e só vou pegar o outro ônibus 3h30”.
Madrugada em Brasília e ainda tem bastante gente no ponto de ônibus. O metrô passa em cima, mas o último trem saiu as 23h30. Dona Romana conhece bem essa história. Ela mora em Ceilândia e trabalha em Brasília. Para chegar ao trabalho poderia pegar duas conduções, mas a conta ficaria muito alta. Pelo menos R$ 10,00 por dia. Para economizar, sai de casa com o céu ainda escuro. Antes das 5h o ponto ainda está vazio. “É perigoso demais. Já fui assaltadas duas vezes”. Em plena Avenida Paulista, a jovem acabou sozinha no ponto de ônibus. Camilla Adami, estudante de nutrição, mora longe, estuda o dia inteiro. À noite, encontrou uns amigos e perdeu a hora. “Acho que tem ônibus até umas 2h”. São 2h15, quase 2h20, não veio ônibus. Camila está desistindo, vai para a avó. “Eu vou dizer que o ônibus não passava, e que tive que desistir, senão ia esperar ônibus só às 6h”. Numa região boêmia da cidade, que com a lei seca recebeu uma linha destinada aos baladeiros, foi aprovada mesmo pelos trabalhadores da noite. “É difícil pegar o pessoal que vem da balada aqui. O pessoal que vem da balada continua andando de carro ou ainda está nos barzinhos bebendo”, afirma o motorista Edson Sparafan.