Uma em cada quatro carteiras de gratuidade no transporte público da capital é negada no processo de recadastramento da Prefeitura de Salvador, iniciado este ano e que vai até 20 de janeiro de 2009. É o balanço parcial feito por Gustavo Almeida, coordenador da Unidade de Gratuidade para Pessoas com Deficiência (UGPD), órgão vinculado à Prefeitura de Salvador que realiza as perícias e concede o benefício do passe livre.
Ele diz que o principal motivo da recusa é que muitas pessoas tinham recebido o benefício sem ter direito. “A gestão anterior concedeu passes sem observância legal. Não tem sentido continuar um erro”, defende. Na abertura do recadastramento, a quantidade de beneficiados chegava a 66 mil pessoas. “Um ano antes, eram 33 mil. Foi um crescimento absurdo em pouco tempo”, avalia.
Entidades representativas das pessoas com deficiência garantem que as negativas estão sendo dadas sem justificativa. “A prefeitura está a serviço do Setps. Os empresários dizem ter prejuízos, porque 30% dos usuários não pagam. Mas não apresentam as tabelas dos lucros nas reuniões”, acusa Edmundo Santos, membro da Associação Vida Brasil, organização não-governamental que trabalha com os direitos destes cidadãos.
Há cinco anos, a dona-de-casa Nivaldeci Arcanjo, 34, sofreu um acidente que a impediu de andar. Ela ainda se recupera do problema, mas teve a revalidação do cartão recusada. “Cheguei aqui com relatório médico e o perito disse que não tenho nada demais. Não posso trabalhar e meu marido está desempregado”, reclamou a usuária. Já o ex-encanador industrial Aurelino Mota, 49 anos, conseguiu a renovação da carteira, mas foi avisado de que não poderia continuar com a permissão de acompanhante. Vítima de um acidente há cinco anos, ele ficou com debilidade permanente no pé esquerdo e precisa de muletas para andar. “Quando saio para resolver algo, como estou sempre em risco de cair, preciso de alguém para me ajudar. É uma humilhação que a gente passa nos órgãos públicos e nos ônibus”, protesta. Nenhum dos dois possui comprovante da recusa do pedido. O coordenador da UGPD, Gustavo Almeida, admite que o indeferimento é feito apenas verbalmente, mas que “nada impede os usuários de pedirem uma cópia do processo”. Para Wilson Cruz, secretário da Comissão Civil de Acessibilidade de Salvador (Cocas), que reúne 17 entidades de deficientes, este é mais um ardil da prefeitura. “Se a entrada não foi de boca e teve um protocolo, por que este procedimento informal?”, questiona. Até mesmo quem pleiteia a primeira via tem queixas do sistema. Maria Luiza Costa, 40, sofre com uma paralisia cerebral estática, doença que limitou o funcionamento do lado direito do corpo. Depois de 12 cirurgias corretivas, ela consegue hoje se movimentar com dificuldades. Há dez meses, Maria Luiza vem lutando para conseguir tirar a primeira via do passe, sem sucesso. “Eles dão prazo para entrega, mas faltando dois dias ligam para informar que não está pronto”. Além de problemas com a gratuidade, as pessoas com deficiência reclamam da falta de acessibilidade no transporte público. “A linha que utilizo, Vale dos Rios, não tem veículo com elevador para cadeirante”, reclama Maria Luiza. Salvador conta com apenas 313 ônibus adaptados para deficientes físicos, o que equivale a 13% da frota de 2.407 veículos, segundo a Superintendência de Transportes Públicos. De sete estações de transbordo (Lapa, Rodoviária, Iguatemi, Mussurunga, Pirajá, Aquidabã e Barroquinha) apenas a da Lapa e Pirajá possuem algum equipamento voltado para os deficientes – ganharam no ano passado dois banheiros adaptados cada. Na Lapa, foram construídas rampas no meio-fio. Segundo informações da STP, com a finalização do metrô, a Lapa vai contar também com elevadores.