Com um cronômetro e fotógrafo, foram percorridos dois trechos de carro: um na marginal Pinheiros, da ponte dos Remédios até a ponte Engenheiro Ari Torres, sentido Interlagos, e outro na av. dos Bandeirantes, da ponte engenheiro Ari Torres até o Complexo Viário Maria Maluf, no sentido das entradas para as rodovias que levam ao litoral. As duas viagens foram repetidas antes e depois do início do funcionamento trecho sul do Rodoanel. Uma etapa foi no dia 22 de março e a outra na última segunda-feira (5).
Na comparação, o maior destaque foi a constatação da diminuição do tempo para atravessar a avenida dos Bandeirantes. No dia 22 de março, foi gasta 1 hora e 13 minutos, período que foi reduzido para apenas 30 minutos no último dia 5, quando os caminhões que chegam do interior do Estado em direção ao porto de Santos já podiam optar por não atravessar a região central da cidade. Só no início da avenida, uma marca já assustava: os sete quarteirões até a Rua Dr. Otávio de Oliveira foram vencidos em 40 minutos antes do novo trecho do Rodoanel – na última segunda-feira, a distância consumiu apenas 1 minuto.
Na marginal Pinheiros, no entanto, foi observado um acréscimo no tempo. Mesmo com a inauguração de mais um pedaço do anel viário ao redor da capital, a reportagem gastou 3 minutos a mais para percorrer o trajeto escolhido – foram 30 minutos no dia 22 de março e 33 minutos no dia 5 de abril. Nas duas datas, a movimentação do tráfego foi bastante similar: calmaria da Ponte dos Remédios até a ponte Cidade Universitária e congestionamentos pesados até o acesso à avenida dos Bandeirantes.
Apenas uma similaridade foi notada nos dois percursos: houve uma redução visível do número de caminhões. Em um ponto escolhido aleatoriamente para uma medição informal na região do Jockey Club, era possível registrar do carro pelo menos 20 veículos de carga no dia 22 de março, uma frota que tomava totalmente as duas faixas da direita da marginal Pinheiros. Do mesmo lugar, no dia 5 de abril, eram vistos apenas 5, apesar do espaço obtido com o “sumiço” dos caminhões já ter sido ocupado por outros veículos de pequeno porte.
Perto do aeroporto de Congonhas, a contagem na avenida dos Bandeirantes também indicou uma queda expressiva: do local escolhido para a análise eram observáveis 25 caminhões antes do Rodoanel, contra 10 na data posterior à inauguração da obra.
As duas viagens foram repetidas em dias da semana idênticos (segunda-feira), nas mesmas faixas de circulação (segunda da esquerda), na mesma velocidade média (70 km/h), nos mesmos horários (início às 18h17 no primeiro percurso e às 18h55 no segundo, em ambos os dias). Os levantamentos não têm valor científico, mas especialistas ouvidos acreditam que os resultados comprovam algumas teses sobre o impacto da nova obra no trânsito de São Paulo.
Para Dario Rais Lopes, secretário dos Transportes de São Paulo (2003 a 2006) que participou das discussões oficiais sobre o anel viário, as estimativas já previam que a avenida dos Bandeirantes teria uma melhoria mais rápida. “Ela (av. dos Bandeirantes) tem uma característica única, que é ligar a marginal ao sistema Anchieta-Imigrantes, por isso a redução do trânsito é mais visível. Já a marginal Pinheiros tem vários usos: serve de ligação entre muitos bairros de São Paulo, ficando menos vulnerável a essa mudança”, argumenta ele, que hoje é professor de Projeto Urbano da Universidade Mackenzie e se diz favorável ao projeto do Rodoanel.
Como argumenta Lopes, no entanto, as autoridades não devem encarar a nova obra como a derradeira salvação e precisam impor limites para que o espaço ganho com a retirada dos caminhões não seja perdido rapidamente com transporte individual de passageiros. “Não podemos repetir o erro do passado, quando tivemos uma melhoria por conta do rodízio que foi logo vencida por novos carros em circulação”, diz.
O ex-secretário alega que devem ser pensados métodos como o pedágio ou a proibição do tráfego para evitar que os caminhões não voltem para a av. dos Bandeirantes. “Não pode deixar solto. No restante da cidade, o transporte coletivo deve ser impulsionado, com novos corredores e outros projetos. Sabemos que há carros ociosos. Quando a pessoa sente que o trânsito está melhor, deixa de pegar ônibus e tenta ir de carro. Essa substituição não pode ocorrer”, afirma.
Superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), o urbanista Marcos Bicalho também concorda com a eficiência do Rodoanel, mas igualmente alerta para a falsa impressão de que a obra é a solução para os problemas de tráfego na metrópole. “A cidade deveria estar dentro de um plano metropolitano de transportes, com um horizonte de investimentos. Como não temos esse plano ou eles não são levados a sério, boas obras como essa são lançadas com outras nem tanto, o que não nos permite um desenvolvimento ‘sustentável’”, afirma.
Como ele explica, a capacidade viária da capital está esgotada. “Há medições que indicam que, se no horário de pico, você conseguir contar quantos carros estão na rua, encontraria no máximo 500 mil. Mas a frota flutuante bate 5 milhões de carros”, compara ele, também defendendo a tese de que há veículos ociosos e um crescimento da frota acima do ideal. “A solução é transporte público coletivo. A demanda crescente em pistas como Rodoanel vai tornar nossa estrutura novamente saturada em breve”, prevê.