Seis meses depois do início da operação do novo sistema de transporte coletivo em Porto Alegre, os resultados ainda não saltam aos olhos da população. Divulgado como uma chance de dar sangue novo ao sistema, com maior qualidade e comodidade nos ônibus a um custo mais acessível, o novo contrato é visto como bem-sucedido pelo governo municipal, ainda que usuários e ativistas mantenham muitas críticas ao processo.
O diretor-presidente da Empresa Pública de Transportes e Circulação (EPTC), Vanderlei Cappellari, diz que a implementação do edital está dentro do cronograma. Metas como a renovação imediata da frota em 296 carros e a ampliação gradual dos veículos com ar-condicionado estão sendo cumpridas, garante. O atual momento, segundo ele, é de preparar a instalação dos sistemas de câmeras e GPS, com prazo até abril do ano que vem.
"Isso vai melhorar muito o controle público e operacional do sistema", diz Cappellari. No momento, estão sendo definidas as especificações técnicas para que os equipamentos dos ônibus sejam compatíveis com a rede de monitoramento da EPTC.
Outra medida importante é a consolidação do conselho de usuários, que está sendo discutido nos 17 fóruns regionais do Orçamento Participativo em Porto Alegre. Cada regional terá um representante no conselho, que se somará a quatro integrantes que virão da Câmara Temática de Circulação e Transporte, em um total de 21 membros. O conselho tem como objetivo dar suporte à EPTC na fiscalização do sistema.
De acordo com Cappellari, estão sendo feitas medições que vão oferecer ao conselho de usuários os subsídios necessários para avaliar a eficiência do serviço prestado pelas empresas. "Se um consórcio não cumprir as metas em um determinado período, terá que apresentar um plano de recuperação. Se o problema persistir, estarão passíveis de multa de até 1% do lucro anual", afirma Cappellari.
Viabilizar a licitação, a primeira da história do transporte coletivo da Capital, foi uma luta considerável. Nos dois primeiros processos, em junho e novembro de 2014, nenhum consórcio apresentou propostas. O terceiro certame, concluído em setembro do ano passado, elegeu as mesmas empresas que já operavam o sistema na cidade, rearranjadas em quatro novos consórcios: Via Leste, Mais, Mobi e Viva Sul. Uma única empresa de fora se inscreveu, mas acabou retirada da concorrência por não cumprir todas as exigências do edital.
Segundo dados da EPTC, a idade média da frota caiu de 5,8 para 4,9 anos a partir da nova operação do sistema. A renovação da frota, garante o órgão, reverteu em queda de 24% nas quebras de veículos em serviço e de 27% nos acidentes envolvendo coletivos. Houve, também, um pequeno aumento no número de veículos circulando, de 1.702 para 1.715, mas ainda abaixo da meta inicial, de 1.781.
Conselheiro diz que mudança só favoreceu empresários
Representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu) da Capital, Alceu Weber critica os resultados observados nos últimos seis meses. "Não era mesmo possível esperar nada de novo. As coisas só ficaram boas para os empresários, que garantiram 20 anos de exploração legal do sistema, sem a devida fiscalização", critica.
Na visão de Weber, não houve qualquer melhoria em problemas crônicos, como a lotação nos veículos e os atrasos nas viagens. "Linhas como a Cruzeiro (282) estão operando nos mesmos horários, com menos veículos. Os motoristas encurtam o tempo de viagem para não chegarem tão atrasados, e a superlotação continua acontecendo."
Ele também critica a formação do conselho de usuários - incapaz, segundo Weber, de oferecer garantias efetivas à população. "É um conselho de cartas marcadas. Seria muito mais importante dar um novo caráter aos mecanismos que já existem, como o próprio Comtu", dispara.
Já existem, na visão de Weber, elementos que caracterizam quebra de contrato por parte das operadoras do serviço. Mas ele não acredita na capacidade do atual governo para fiscalizar esse processo. "Talvez a partir de uma nova prefeitura, que leve em conta o interesse público e não o das empresas, seja possível entrar com uma ação popular. Atualmente, as empresas não se preocupam com nada, têm liberdade total."
Superlotação e atrasos ainda incomodam usuários
Na percepção dos usuários, a demora e o aperto seguem sendo desagradáveis companheiros de viagem. "Para mim, continua uma porcaria", diz Sabrina Santos, que atua como auxiliar de limpeza na região central de Porto Alegre. "Os ônibus estão mal cuidados demais. A tarifa (R$ 3,75) é um absurdo, não se justifica."
Usuário da linha Pinheiro (398), o auxiliar de higienização Samuel Vargas diz que os ônibus "só mudaram de cor". "A gente viaja esmagado. Cansei de viajar em pé com a minha filha. É perigoso, pode acontecer um acidente." Mesmo concordando que os ônibus mais novos apresentam melhores condições, a baixa quantidade de assentos especiais também incomoda. "Não existe preocupação com quem precisa", lamenta.
Mas há também quem esteja feliz com as melhorias. A doméstica Janaína dos Santos Nunes vai e volta do bairro Belém Velho todos os dias e se diz satisfeita com o respeito aos horários e a maior variedade de linhas à disposição. "No meu caso, melhorou muito. Era muito demorado, sempre lotado. Agora, cumprem a tabela, os ônibus estão mais limpos", comemora.
De acordo com a EPTC, a meta estabelecida para 2018, de reduzir a lotação nos ônibus de seis para quatro pessoas por metro quadrado, está sendo atingida com grande antecedência. Algo que se reforça com a queda de 7% no número de passageiros pagantes, registrada nos últimos cinco meses. "Os índices (de eficiência e comodidade nas viagens) apresentam grande melhora. Há linhas que apresentam problemas, mas isso vai melhorar com a avaliação da taxa de ocupação via GPS, em tempo real", diz Vanderlei Cappellari.
Por Igor Natusch
Informações: Jornal do Comércio