Nos últimos 10 anos, Fortaleza tem registrado mais de 20 milhões de deslocamentos de passageiros, em média, por mês. Entre 2014 e 2017, tendo em vista esta demanda, a frota de ônibus era crescente. Mas, nos dois últimos anos, o sistema de transporte coletivo da capital cearense tem registrado queda da quantidade de veículos. O total de veículos cadastrados (frota que engloba os carros em circulação e os reservas) passou de 2.301 em 2017 para 2.141 em 2019.
Os dados relativos à frota da capital cearense foram obtidos pelo G1 via Lei de Acesso à Informação (LAI). Nas ruas, usuários alegam sentir os gargalos no dia a dia, sobretudo, de superlotação em determinados trajetos e horários.
A diarista Antonieta Soares, conta que precisa deslocar-se de ônibus, pelo menos três vezes por semana, seguindo do Bairro Vila Peri para o Dionísio Torres. Para ela, em determinados horários, as viagens continuam cansativas, sobretudo, devido a dois fatores: o tempo de espera e a lotação do ônibus.
Já o estudante Jonas Rodrigues, morador do Bairro Papicu, admite que o transporte público de Fortaleza tem passado por melhorias, mas reclama da superlotação persistente em linhas e horários distintos. Para ele, essa condição pode ser um efeito da redução da quantidade de coletivos.
Os dados repassados pela Divisão de Planejamento da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) apontam ainda que o volume de deslocamentos – quantidade de passageiros registrados –, no primeiro trimestre de 2019 em Fortaleza, foi 10,41% inferior, se comparado ao período semelhante de 2018.
Para o vice-presidente da Etufor, Antônio Ferreira, ao analisar o quantitativo adequado da frota do transporte coletivo deve-se considerar não somente a frota global, mas sim a quantidade de ônibus necessária linha a linha. “A gente pega uma linha, a demanda da linha, vamos por cada faixa horária, ver quantos passageiros estão passando. Vou dimensionar a frota por horário de pico e vou dimensionar no trecho crítico. Pego a faixa horária, vejo quantos passageiros tem e vou determinar qual é a quantidade de viagens que eu preciso”, informa destacando a complexidade da definição da quantidade adequada de coletivos.
Conforme Ferreira, a frota em Fortaleza cresceu em determinados anos mas a demanda caiu em função de vários fatores, como: a crise econômica, as novas modalidades de transporte e as facilidades que a tecnologia tem provocado com menor demanda de deslocamentos.
O superintendente técnico do Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus), Pessoa Neto, reitera que a redução da quantidade de coletivos tem relação direta com a retração da demanda, que, segundo ele, ocorre, sobretudo, desde o final de 2015. Conforme o representante do Sindiônibus, inicialmente, a diminuição de passageiros foi justificada pela crise econômica, mas posteriormente percebeu-se que há outros fatores.
Segundo Pessoa Neto, a partir do momento em que se constatou a redução da demanda, houve diminuição da frota. “Mas é uma redução muito cuidadosa porque nós não podemos simplesmente pensar, se a demanda caiu 10%, vamos reduzir a frota em 10%. Até pra tomar uma decisão dessa é feito estudo linha por linha. Nós só tiramos um veículo de circulação após uma ordem de serviço da Etufor”, explica.
Hoje, de acordo com o superintendente técnico, há 24 pesquisadores do Sindiônibus designados para fazerem a contagem de passageiros de linhas diversas, além de outras formas de assessoramento para adequação da oferta de viagens à demanda. “A redução não é linear, muitas vezes a gente tira carro de uma linha e transfere para outra. Não podemos fazer uma viagem a mais ou a menos sem ir para o órgão gestor”.
Redução gera efeitos diretos em trajetos
A disposição do transporte coletivo segue a ordem econômica e, portanto, a oferta cresce sempre que a demanda garante essa ampliação, explica o professor de economia de transporte da Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade da Universidade Federal do Ceará (UFC), Gildemir da Silva. “Se a demanda está em oscilação, para o operador, isto é uma justificava para reduzir a frota”, completa.
No entanto, o professor avalia que, embora a redução da frota seja "um fenômeno natural por conta da economia", o efeito dessa ação é sentido diretamente pela população pois, segundo ele, a cidade tem crescido e a redução implica na rotina de quem precisa fazer trajetos mais longas.
"Com a frota maior, as empresas de ônibus atendiam com mais frequência determinadas regiões da cidade”, ressalta. Nesta lógica, diz o professor, há menos frota para atender a mais quilômetros.
A espera por coletivos, acrescenta ele, tem provocado outro fenômeno que é a antecipação ou atraso dos passageiros no planejamento dos trajetos. “Com a redução, o operador pode até estar operando melhor. Mas os passageiros não contam com qualidade interna, sobretudo, em horário de pico. Para fugir disso, as pessoas estão saindo de casa cada vez mais cedo e deixando para voltar mais tarde, quando os ônibus ficam menos lotados”.
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